Primeira vez neste site? Então
[clique aqui]
para conhecer um pouco da CBJE
Antologias: atendimento@camarabrasileira.com
Produção de livros: cbje@globo.com
Contato por telefone
Antologias:
(21) 3393 2163
Produção de livros:
(21) 3547 2163
(21) 3186 7547

Neide Araujo Castilho Teno
Dourados / MS

 

O peso do amor oportunista

Era uma jovem feliz, inocente nos seus 16 anos de vida. Poucos namorados, mas acabou-se apaixonando perdidamente, por um daqueles que fazem promessas e juras infindáveis. O pretendente era órfão de pai, vivia sob a proteção da mãe e do padrasto com um projeto de vida bastante claro: terminar os estudos interrompidos, e ser juiz um dia.
Como nenhum amor é único, esse também não foi, embora o pensamento de adolescente caia sempre no abismo e na crença de que só pode amar uma única vez, a vida não pode parar por conta de um amor mal sucedido. Agora, estava no último ano dos estudos e ela estava só. Solidão de companhia amorosa, mas não de afeto familiar.
Durante as férias, conhecera outro amor , justamente no momento em que passava por períodos de angustia, depressão, sentindo-se a pior das criaturas, sem amigos, rejeitada por todos, mal compreendida. Uma fase que tudo de ruim acontecia: no voley que praticava não acerta uma bola, nas provas nenhuma nota azul, já não era mais convidada para a roda de amigos, e sucessivamente muita acontecimentos desfavoráveis iam se desfiando vida afora. No momento de percas é que se conhece o ser humano e suas fraquezas e a capacidade de se dar lugar para a felicidade.
A apatia que toma conta de quem perdera um amor, chega a ser quase uma obsessão, a tal ponto de não olhar mais para o amor próprio. Por isso torna praticamente impossível usar argumentos de benevolência, ou trazer à pessoa a tona da realidade. Quanto mais se usava argumentos contra o ex-namorado, mais a pessoa se aborrecia. Quanto piores tratos recebia mais se sujeitava em ficar perto do pretencioso.
A perca da identidade trouxe momentos de inteira insanidade mentais, e com isso tornou uma presa fácil de manipular, pois não conseguia deixar de ler as mensagens falsas de amor. Assim as palavras enchiam de esperanças a vida e a pessoa passa a cultuar de um amor oportunista, malicioso dizendo que ama.
Embora conhecesse outra pessoa nas férias a jovem não se oportunizava um novo conhecer. Foi ai que seu psicólogo disse:
____Coloque nessa folha de papel, em duas colunas os momentos alegres, as participações coletivas da vida que você deseja, contra aquilo que não quer para você.
Prontamente a jovem tomou várias folhas de papel. Pensou, pensou, chorou ao recordar, e trouxe à mente as lembranças anteriores saíram e voltaram dentro de uma hora. Encheu os papeis com a histórias, de férias, de viagens feitas com a família, de festas juninas, de encontros na escola, de piqueniques e rodas de tereré. Na medida em que as folhas iam ficando cheias ela se deu conta do tamanho dos malefícios que impediram-lhe e de crescer.
Assim compunha a lista dos bens desejáveis: o prazer reconhecido pela presença do outro, a felicidade de um encontro em fim de tarde, o prazer de uma caminhada, a experiência da honestidade, da alegria de conter os vícios, da ausência de traições.
Em contrapartida trouxe da memória em que momentos vivenciou tais bens. Qual não foi a surpresa no momento que voltou aos seus dezesseis anos e elencou: as imensas brigas por ciúmes, a falta de confiança nas ausências, as relações tumultuadas por traições, as tristezas pela falta do companheirismo, as mentiras nas ausências, a perca da própria identidade, as ameaças incontidas.
A historia de Jacobina , no conto de Machado de Assis, que tornou Alferes aos 25 anos, causava inveja em muitos jovens da época, assim como a jovem feliz do conto. O alferes eliminou o homem e deu lugar para a inveja caracterizando duas almas. Uma alma olhada de dentro para fora transmitindo anseios e valorizando a consciência individual. Assim como a jovem de dezesseis anos, simples que estudou e passava a ser vista como uma competidora profissional.
Olhando a historia do conto de fora para dentro pode-se revelar outra alma, composta de valores puramente interesseiros, indispensáveis para o cumprimento de metas profissionais. Houve choro e ranger de dentes revelando um tom de incertezas e volubilidade das coisas. A alma exterior desabrochara e ganhara um peso maior, como a perda dos educados e a morte do amor.
Não há como desacreditar no amor, ele está posto para uma vida de compromisso sincero, capaz de atravessar barreira, seja ela social , econômica , racial e temporal. Um amor capaz de resistir ao tempo, resistir às tentações do mundo, na busca da fidelidade.
O tempo de Jacobina não é o tempo da linda jovem, mas não deixara de ser uma personagem que se sentia perdida no tempo e no espaço, pela eternidade da espera do amor. Tanto Jacobina como a jovem feliz tem no tempo o principal perigo a desvendar. A angustia de Jacobina diante de sua imagem no espelho a espera de alguém que nunca chegara , contrapõe as angustias da linda jovem que não se confortava com a perca do amor na adolescência.
O transcorrer do tempo acarretara uma sensação iminente de depressão na jovem feliz que de certa forma contribuía para a dissolução do seu “eu”, perda da identidade, na crença de que o amor de férias não valeria a pena.

   
Publicado no livro "Os mais belos Contos de Amor" - Edição Especial - Outubro de 2014