Zildenice de Souza Martins
Rio de Janeiro / RJ
Pequena porção de mamão
Este conto foi baseado em uma história real.
Uma história que o amigo de um amigo meu contou. Achei
essa história tão bonita que desejei reproduzi-la
em um conto para que o mundo soubesse. Espero que os personagens
reais não fiquem zangados, pois adaptei um pouquinho os
fatos para dar o meu toque de poeta à história.
Janaína era uma jovem senhora de 43 anos acometida por
um agressivo câncer no pâncreas. Em seu leito de morte,
iniciou um diálogo tocante com seu marido. Pedro era um
homem incansável. Há um mês e quinze dias
permanecia ao lado de Janaína na enfermaria do hospital
onde estava internada.
– Ah, meu querido, sinto tanto por partir tão cedo.
– Eu também, meu amor. – ele respondeu com
a voz embargada.
– Gostaria de aproveitar esse nosso momento juntos para
pedir perdão pelos meus erros e dizer que você me
fez muito feliz. – disse com a voz cansada, e depois prosseguiu:
– Quero saber também se nesses vinte anos de convivência
houve alguma coisa que eu fiz para você e que não
tenha sido de seu agrado.
– Nós não devemos pensar nisso agora, meu
amor – retrucou receoso.
– É importante para mim. Fale como último
desejo de uma moribunda – disse de forma insistente.
– É algo bem simples e que não faz diferença
alguma. – ele falou ainda reticente.
– Então fale, eu insisto! – falou Janaína
em tom definitivo.
– Eh... Bem... É que eu odeio mamão. –
confessou finalmente.
– Como assim?! – ela ficou atordoada com a revelação.
– Você adora mamão! Você come mamão
todos os dias no café da manhã! Por que você
não me disse isso antes? – perguntou ainda desconfiada.
– Porque na nossa primeira manhã juntos você
trouxe uma grande fatia de mamão para eu comer. Como a
bandeja de café da manhã estava tão linda,
não tive coragem de falar o quanto odeio profundamente
essa fruta. Então, comi o mamão depressa para me
livrar logo dele. – desabafou, sentindo-se um tanto aliviado.
– Pensei que você adorasse mamão, porque você
comeu com tanta vontade! Por isso eu sempre incluía uma
porção de mamão no seu café da manhã.
– falou com tristeza. – Ah, meu amor, se eu soubesse...
Se você tivesse falado... Não teria torturado você
por tantos anos com essa fruta.
– Não tem problema, meu amor. – disse com lágrimas
nos olhos. – Cada pequeno pedaço de mamão
que eu comia me fazia lembrar o quanto você me amava e como
cuidava bem de mim.
Dito isso os dois se abraçaram e choraram juntos. De repente
vinte anos pareceu pouco tempo para a intensidade do amor que
os dois cultivavam.
Contrariando a previsão dos médicos, Janaína
melhorou e viveu plenamente por mais dois anos. Durante esse tempo
eles até conseguiram concretizar uma viagem romântica
à Buenos Aires, mantendo o hábito de comerem sempre
juntos uma porção de mamão no café
da manhã para celebrar seu amor.
Infelizmente, em uma bela manhã de primavera, chegou o
momento de Janaína deixar Pedro. Ele, então, continuou
sua jornada, não esquecendo o hábito de comer sempre
uma porção diária de mamão no café
da manhã para lembrar a bela vida que teve ao lado de sua
amada.
Desejo também a você, caro amigo leitor, que caso
ainda não tenha encontrado, que ache alguém por
quem valha a pena comer uma pequena porção de mamão
no café da manhã.
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