Primeira vez neste site? Então
[clique aqui]
para conhecer um pouco da CBJE
Antologias: atendimento@camarabrasileira.com
Produção de livros: cbje@globo.com
Contato por telefone
Antologias:
(21) 3393 2163
Produção de livros:
(21) 3547 2163
(21) 3186 7547

  Anchieta Alves de Santana
Uruçuí / PI

 

Menina aos 114 anos

 

                  A lei nº 290 é de 23 de junho de 1902, mas foi numa manhã ensolarada do dia 07 de setembro daquele ano que, de fato, nossa vila “passou a ser cidade”; ela foi, politicamente, emancipada. A solenidade aconteceu na residência do Major Theóphilo Santos. Inicialmente a grafia era Urussuhy; um nome pomposo e, de certa forma, emblemático; hoje, igualmente místico, Uruçuí. Em ambas as grafias um significado possível é “abelha que vive próximo às águas”. É isto, a cidade de Urussuhy é filha da união do majestoso rio Parnaíba com o rio Uruçuí Preto. Uma união abençoada pelo maranhense rio Balsas. Rios que matam sede de homens e outros animais, produzem alimentos e servem como “estrada líquida” para os viajantes se transportarem e levarem  seus produtos para outros recantos num ritual de quase escambo. E nesse andar pelas águas não se pode deixar nos labirintos do esquecimento pessoas como William Thomas Pearce e seu filho adotivo José Martins Neiva(Mainha). Estes foram mestres da navegação nesses rios que correm por aqui. Aqui em nossas veias. Já são 114 anos de uma história de idas e vindas e muitos causos. Histórias como a  passagem da Coluna Prestes, em 1926 e a prisão de um Juiz de Direito que, após inquirido foi deixado à deriva dentro de um barco nas água daquele que Da Costa e Silva batizou de “Velho Monge”.
             Há trinta e três anos, olhando as fragilidades de Uruçuí, seu encanto natural e sua vocação para o crescimento a denominei Cidade Menina. Ainda hoje a vejo assim, com performance e meiguice de menina. Menina que sonha e cresce na lentidão dos dias e na pouca vontade dos homens.  Menina que ainda se deixa enganar por vontades passíveis de contestações. Muitos foram os gestores que tomaram os interesses municipais em suas mãos e poucos os frutos sadios. Mais gestores que frutos. Mais desafios que resoluções. Dentre tantos fatos, causos e pessoas, dá-se aqui, realce à vida arquitetônica que ganhou vida por aqui. E, para lamento da cultura e da história, ganhou, igualmente, sucumbência.
           Ainda me lembro de resquícios da praça Getúlio Vargas que ficava às margens do rio, no primeiro centro urbano; ali, existia, também, um Coreto. Este era um lugar de encontros para festejos e onde aconteciam todos os eventos festivos da cidade. Políticos, religiosos e outros realizavam ali, suas ações. A título de exemplo, a comemoração do centenário de Independência do Brasil foi um grande evento que teve o Coreto como palco, e contou com a presença de ilustres professores como o jovem José Patrício Franco e Maria Pires Lima. Desapareceu o Coreto da praça e a praça do Coreto.
           Quando a sociedade buscava lazer tinha a União Artística Operária Uruçuiense como ambiente ideal. A estrutura do prédio possuía um design singular e ficava ao lado da primeira construção da igreja matriz. Bailes e comemorações sociais diversas aconteciam nesse ambiente. Foi mais uma edificação vitimada pela ação voraz do homem. Tinha também o Clube Atlético Recreativo Uruçuiense que, também, foi o point festivo por várias décadas. Também foi demolido pela gula imobiliária e a ignorância cultural de algumas pessoas. E mais, o Cais às margens do generoso rio Parnaíba foi engolido pelo avanço das águas e o descuido administrativo.
          Outra construção que também cedeu lugar a estruturas rústicas foi o conhecido “Sobrado da Família Estrela”. Ficava ao lado da praça Getúlio Vargas. Era um solar com escadaria de madeira bem produzida num acesso lateral ao primeiro piso. E ainda no entorno da praça, existia a sede da primeira edificação da prefeitura municipal; e nas proximidades a antiga delegacia de polícia. Esta, ainda de pé; ainda cumpre o seu papel original de manter prisioneiros. Antes por causa de delitos e assemelhados, agora, virou bar e as pessoas, atualmente são prisioneiras da bebida e das cartas. É o trato cultural na contramão.     
            E nesse passo também outras edificações foram demolidas. Mas vale ressaltar que alguns prédios ainda resistem de pé. Como símbolo da resistência ao desmonte arquitetônico na nossa cidade, cita-se as residências: da família Pires e da família Coelho. Mas não tombados como patrimônio histórico cultural do município. Apenas a igreja matriz de São Sebastião, da década de 50, foge à regra; é, legalmente, reconhecida como patrimônio cultural.
            Por fim, Uruçuí é uma garota que ainda não toma os devidos cuidados com aquilo que é seu. Ainda se parece com uma menina em fase de formação.

 
 
Poema publicado no livro "Os mais belos Contos de Amor" - Outubro de 2016