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Sergio Tavares
Maceió / AL

Amor de traição

 

- Lembra quando te contei sobre Euclides da Cunha? Enquanto ele se dedicou a acompanhar por meses seguidos a campanha dos soldados, que ocorria em Canudos, foi traído, vindo a ser morto pelo amante de sua mulher.  Este escritor teve sonhos e lutou para conseguir concretizá-los, porém, este grande revés em sua vida, destruiu todos os seus sonhos. Quanto à traição, não vale a pena ficar esmiuçando essa falta de valor moral e de amor com a pessoa amada. Nós temos que analisar como seres humanos, que somos, cheios de defeitos e, sujeitos às fraquezas morais. Até que ponto  somos culpados por termos sido traídos?
Após uma pausa, sem responder à pergunta, apenas deixando-a no ar para  reflexões sobre o assunto, continuou:
- No teu caso, por exemplo, se me permitir citar o assunto, sobre Judite.
Balancei a cabeça afirmativamente, enquanto ele prosseguiu:
- Ela o abandonou e seguiu viagem com outro homem que conheceu. Ela percebeu que gostava mais dele, sendo sincera contigo, confirmando a traição e, preferindo deixá-lo do que fingir que nada aconteceu. É melhor que seja assim, pois o pior de tudo é viver sendo enganado por muitos anos. E não sei se aceitarias uma mulher que o enganasse, que o traísse e, somente ao final da vida tivesse coragem de contar a história verdadeira. Isto pode ser pior se o homem não estiver preparado para ouvi-la e entendê-la de uma forma consciente. 
            Nesse momento, o Velho Marinheiro, começou a falar lentamente:
- A vida me ensinou muitas coisas no decorrer dessa caminhada: aprendi a ter fé, a fazer caridade, aprendi a amar ao próximo como a mim mesmo e, tudo isto dentro de um esforço de reformar-me intimamente. Todos os dias eu procuro fazer perguntas a consciência, não apenas para me entender, mas, também, para compreender ao próximo. E vejo que o problema não é só das outras pessoas, mas nós, temos grande parcela de culpa em tudo o que acontece conosco. E muitas vezes somos culpados pelo que deixa de acontecer. Mas não podemos ficar chorando o leite derramado, temos que dar a volta por cima e seguir em frente.
Olhando fixamente para mim ele disse:
- Já que me perguntou, eu vou revelar um fato, que eu gostaria de levar comigo para o túmulo, mas um dia vais entender o motivo de ter te contado. Eu acredito que nós não podemos viver em um mundo de mentiras. Se construirmos a nossa vida sobre um monte de mentiras, um belo dia ela vai desabar, pois não vai suportar o peso da verdade. Eu demorei todos esses anos para ir reencontrar minha filha Sara... pelo seguinte motivo... a Virgínia, quando se encontrava muito doente, me disse que tinha algo importante para falar e que jamais poderia morrer sem me contar a verdade.
Bartolomeu relembrou, então, a conversa com sua esposa.
- Olha, Virgínia, é melhor não fazer nenhum esforço, pois estás muito enfraquecida e tens que se recuperar... Estás convalescente... e além do mais, o que pode haver mais sério do que a sua doença?
- Bartolomeu, eu sei muito bem que a minha vida está por um fio, pois ouvi o Dr. Freitas falando, que eu não passo de hoje, mas eu não posso ficar em paz sem o teu perdão. Diz pra mim que vais me perdoar? Eu imploro, pelo amor de Deus?
E depois de alguns minutos em silêncio, entre pensamentos e soluços de um choro copioso, disse Virgínia com uma voz quase inaudível:
- Pouco antes de nos mudarmos para cá, eu tive um “caso” com meu tio. Foi tudo muito rápido, eu estava empolgada com a possibilidade de viajar para a capital e também de te ajudar a realizar o teu sonho, que acabei me deixando envolver pelas promessas dele. Eu fui uma tola, pois deveria ter te contado desde o início, mas preferi não estragar o teu sonho, pois estavas tão feliz com tudo que acontecia. Quando percebi a minha gravidez, fiquei desesperada. Então, pedi a ele que nos acolhesse em sua casa, porque ele estava para se casar e eu não queria atrapalhar o casamento dele. Portanto, eu já não era mais virgem como pensavas antes de viajarmos. Mas eu juro que te amo e, que eu somente omiti esta história por acreditar no nosso amor. Perdoa-me, não me deixes morrer antes que eu ouça o teu perdão. Perdoa nossa filha Sara, que nada sabe sobre a mentira de sua mãe. Ela precisa de ti, estou morrendo e, minha consciência dói por não ter contado logo a verdade. Ninguém mais sabe a verdade sobre nossa filha, somente eu, agora, você, que sempre será o pai verdadeiro dela...
E entre lágrimas continuou Bartolomeu a contar-me, como se esses fatos estivessem ocorrendo naquele momento e as dores ainda latejassem em seu corpo:
- Imediatamente, Virgínia começou a chorar, enquanto dava seus últimos suspiros. Mal havia tempo para lhe fazer perguntas, saber o motivo e o porquê dessa traição. Meu Deus, o que fiz para merecer um desfecho tão duro em meu coração depois de tantos anos me dedicando a quem amava? Eu que sempre acreditei no amor, e que havia encontrado a mulher perfeita para minha vida...
E entre soluços, gritou Bartolomeu:
- Eu a perdoo... Eu a perdoo amada Virgínia...
Não houve tempo para que ela ouvisse o perdão do Velho Marinheiro.
Virgínia já estava morta!

 

 
 
Poema publicado no livro "Os mais belos Contos de Amor" - Outubro de 2016