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Rozelene Furtado de Lima
Teresópolis / RJ

 

A prova de fogo do amor

 

         

        “O melhor aço passa primeiro pelo fogo”, e é pensando assim que hoje declaro que o que sentimos um pelo outro é amor, aquele amor que é dado a todos, mas poucos resistem às provas e desistem na primeira etapa, por acharem que estão entrando numa gelada e pulam fora amedrontados.   

     Numa daquelas noites que tudo parece sem razão, sem significado, sem justificativa e sentindo um frio na alma, no coração e no corpo inteiro resolvi sair para espairecer, desanuviar, aliviar a tensão e não sei lá mais o quê. Tinha terminado um relacionamento de muitos anos. Completamente desatento, escorreguei num baita “cocô” de cachorro e cai sentado numa poça de lama. Por que não fiquei em casa? Nisso ouvi uma gargalhada sonora, olhei em direção e era uma moça, que com a mão na boca tentava inibir o riso e aproximando de mim estendeu a mão para me ajudar a levantar, mas ela não conseguia parar de rir. Quando fiquei de pé, ela ria cada vez mais, tive vontade de falar um palavrão. Ela olhou para mim pedindo desculpas e dizendo: - Foi muito engraçado seu tombo, você fez tanto malabarismo e acabou espatifando no chão, e ela falava e ria, ria cada vez mais alto. E continuou: - Tem um bar aqui ao lado, vamos lá para você se cuidar. Depois disso ficamos amigos, saímos algumas vezes para jantar, fomos ao teatro, até que começou um namoro e nessas alturas estávamos apaixonadíssimos um pelo outro. 

      Chegou o momento de conhecer a família dela, uma família enorme e viviam se reunindo por tudo e por nada, comemoravam qualquer coisa até a chegada das estações do ano. Aceitei ao convite para festejar a entradado inverno. Um salão grande com mesa posta para umas cinquenta pessoas. Tinha os sérios, os quase sérios e os engraçadinhos que estavam sempre rindo e contando piadinhas ou fazendo trocadilhos. Tudo era motivo de riso e aplauso. Foi aí que entendi o porquê dela ter rido tanto demim. Na mesa tinha uma infinidade de comida, pratos requintados, um cardápio variadíssimo. Ela explicou que cada um levava um prato pronto.

          Começaram as provas, as terríveis provas.  Primeiro foi a apresentação ao pai dela: -  Jorge Luiz, disse ele simpaticamente. E Emília completou: - Pai esse é o João Carlos. Eu olhei para ela, as pessoas que estavam em volta foram saindo de fininho e pai dela comentou: - Ele tem o mesmo nome do seu antigo namorado?  - Meu nome é Alfredo, respondi em tom forte. Ela tinha trocado meu nome. Chegou o momento de sentar à mesa, alguém falou: - Senta aqui do meu lado, senta aqui, disse outro e eu já estava meio sem graça, sentei na primeira cadeira que estava a minha frente. O estofado daquela cadeira era de elástico e eu afundei até quase ao chão. Riram e bateram palmas. Um deles bem alto e forte me tirou da cadeira dizendo: - foi você que escolheu. Ai que raiva! Deu uma vontade de fugir daquele manicômio. E Emília, meio sem jeito, não conseguia controlar o riso. Então, fomos sentar ao lado do pai dela. Serviram de entrada vinho e uma travessa de pastéis pequenos. E eu que amo pastéis, peguei o único que foi recheado com Bombril, quando dei uma mordida tirei da boca e todos viram, mais risos e aplausos. O pai dela falou: sempre tem um com esse recheio e você não foi o primeiro a se servir e foi você que escolheu.  Juro... Tive vontade de fugir e ela apertava a minha mão e não conseguia disfarçar o riso. O porta guardanapos estava no centro da mesa e eu pedi: - um guardanapo por favor, e uma voz vindade não sei de onde, acho que do inferno, gritou: – Alfredo, trás o papel... Mais risadas e palmas. Antes da sobremesa começaram uma batucada na mesa cantando “Escravos de Jó” é linda a música e bem cantada é um show, e eles deram um verdadeiro show musical. Pensei, acho que estou livre para sair. Então começaram: - “Lá no alto daquele morro/ passa boi, passa boiada e também passa fulano de... O fulano completava e falava outro nome. Aí cantaram: - Passa Alfredo de calça rasgada. E se não fui embora até àquela hora, resolvi entrar na brincadeira. Eu tinha que responder e respondi cantando também, para o Zeca (o mais engraçadinho) - Passa o Zeca com as calças lambuzadas. Naquele momento a mãe dela levantou as duas mãos e foi uma gritaria, uma bateção na mesa, apupos e palmas, durou quase dois minutos e aí... a dona da casa disse: - Pode deixar que eu te ajudo e explicou levantando o prato dela,  embaixo tinha uma palavra escrita com pincel atômico e letras bem grandes – LAMBUZADA – e sempre quem  acerta aquela palavra lava a louça toda. Não preciso dizer que passei duas horas na cozinha lavando louça e eles na sala só na brincadeira e cantoria, pareciam um bando dealoprados. Nesse ínterim, foi servido a sobremesa e o cafezinho. Ninguém, mas ninguém mesmo teve pena de mim, não me defendeu nem me ajudou... E a minha querida Emília e amada namorada só sabia gargalhar como uma hiena. E  a “coisarada”  terminou quase meia noite. Teve um sorteio de prendas  e cada sorteado teria que fazer  o trabalho que correspondente ao prêmio, alguns deles:  vassoura e pano de chão,  sacode lixo,  papel higiênico, xícara de cafezinho, e muito mais. Ainda bem que recebi um papel enrolado com uma poesia “ Onde está meu grande amor”, pensei aliviado: - agora vai ser fácil! Que nada... veio uma equipe feminina para me maquiar e me vestiram um vestido justo estampado e puseram uma peruca loura de franjas e cabelo comprido e tive que ler num microfone de rolo de papel. Fui o mais fotografado, aplaudido, apupado, com dose cavalar de risos e gargalhadas. A energia era tão forte e decidida que tudo contribuía para as piores gracinhas saírem para mim.

      Para encerrar - Eu Alfredo, estou casado com Emília há vinte anos a as provas continuam. Coitadinhos daqueles ou daquelas que são candidatos a entrarem para família. Aprendi a ser bem humorado, a rir de tudo e fazer cada gracinha!!!

 

 
 
Conto publicado no "Livro de Ouro do Conto Brasileiro" - Novembro de 2016