Primeira vez neste site? Então
[clique aqui]
para conhecer um pouco da CBJE
Antologias: atendimento@camarabrasileira.com
Produção de livros: cbje@globo.com
Contato por telefone
Antologias:
(21) 3393 2163
Produção de livros:
(21) 3547 2163
(21) 3186 7547

Maria Rita de Miranda
São Sebastião do Paraíso / MG

 

Amor passageiro


Férias de verão. Qualquer coisa dá início a uma amizade. Para que nasça um idílio, basta a solidão e a luz do por do sol. É um tempo de efêmeros amores que talvez nem cheguem ao outono.
As praias do nordeste do país, todos os anos, são visitadas por centenas de pessoas vindas dos mais diferentes lugares. O sol escaldante dá ainda mais um tom de ardência tanto na pele como nos corações dos jovens descompromissados. A alegria parece ser obrigatória para todos. Tomando banho de mar, bebendo nos quiosques, desfilando com a roupa de banho minúscula, ou só se escaldando numa toalha estendida sobre a areia quente, as garotas provocam, mesmo que involuntariamente, os olhares ávidos dos rapazes.
Lúcia era uma menina simples, do centro oeste do país, que trabalhava para se sustentar e ainda ajudar um pouco a família. Dotada de uma beleza fora do comum, arrancava suspiros de admiração dos jovens de sua cidade, bem como olhares invejosos de algumas garotas.
Foi com grande esforço que ela conseguiu economizar alguns trocados para, nas férias conhecer o mar do nordeste, um sonho seu.
Quando janeiro chegou comprou algumas roupas novas, despediu-se da família e sozinha enfrentou a longa viagem. Chegou tão exausta que no primeiro dia só observou a paisagem marítima de relance. Precisava descansar.
Após uma noite bem dormida, toda refeita e linda, saiu da pousada onde estava hospedada e foi pisar a areia quente e clara pela primeira vez. Sentia-se radiante e ávida de aproveitar o máximo esta semana que certamente passaria voando e ela teria de voltar para a sua rotina.
Logo conseguiu se enturmar com um grupo de garotos e meninas que também por ali se divertiam jogando conversa fora e enfrentando, por alguns minutos, um mergulho nas ondas que vinham se arrebentar bem perto da areia. Não pode deixar de responder a algumas perguntas que lhe faziam. De onde era, o que estudava, quais lugares conhecia, a profissão de seu pai. Lúcia, querendo impressionar, respondia a tudo com pequenas mentiras que foram crescendo. Que importância tinha? Neste lugar o sol brilhava igualmente para todos.
Tornou-se de súbito, uma menina muito rica, independente, que viajava sozinha todas as férias, estudante de economia para no futuro tomar as rédeas dos negócios da família.
Um rapaz, João, se encantou logo por ela. Aproximou-se mais e trocaram olhares comprometedores. Logo se isolaram. Ela ficou radiante por despertar aquele interesse repentino, ainda mais sendo João bonito, falante, especial mesmo.
Como era de se esperar, a semana passou mais que depressa e Lúcia teria que retornar. Outras mentiras foram acrescentadas às primeiras. João absorvia tudo com entusiasmo, pois estava de fato interessado por ela. Prometeram se corresponder e os endereços eletrônicos foram trocados. Despediram-se impetuosamente e Lúcia se foi.
Já no dia seguinte recebeu o primeiro e-mail, respondeu e não pararam mais. Depois de algumas semanas, quando Lúcia foi dar uma olhada no seu face book, deu com um pedido de amizade. Espantou-se ao deparar com o nome de João do Nordeste, como era o apelido do namorado. Anexou-o aos amigos e se retraiu ao ler a primeira mensagem enviada por ele: - Por que tanta mentira? Achou que não seria descoberta? Eu a encontrei no face com um perfil completamente adverso daquele que você me pintou. Bonita por fora, mas simulada. Para mim não serve!
Lúcia deletou seu nome do face. Não queria, nem podia se explicar. Mudou seu e-mail e não mais detectou o João, seu suposto amor.
Sofreu por algum tempo, pois não tirava de sua cabeça a ideia de que poderia ter sido aceita pelo que era e não pelo que possuía. Culpou-se, mas o fato já estava consumado. Um dia talvez voltasse ao nordeste e quem sabe conseguiria se redimir. Também, pensava, como pude me esquecer de que hoje em dia, através das redes sociais fica quase impossível ser uma completa desconhecida? Um sorriso maroto lhe aflora e ela se desculpa: foi uma mentirinha de nada, assim como este amor de verão que não conseguiu durar nem mesmo até o outono.
Mas quem a observasse de perto veria uma lágrima teimando em cair, de um olho só, pela face rosada de Lúcia.


   
Poema publicado no livro "Contos Livres" - Edição Especial 2014 - Setembro de 2014