Antologia
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Isabel
Cristina Silva Vargas
Pelotas / RS
A rosa
Casaram-se em uma idade em que não eram mais considerados
adolescentes.
Ele com 28 anos e ela com 25. Ambos trabalhavam no serviço
público, com salário garantido e possibilidade de
crescimento profissional. Ela já formada e ele em vias
de se formar.
Ela estava grávida e foi por isso que anteciparam o casamento
para a gravidez não se tornar tão evidente. Afinal,
ela sempre gostava de fazer tudo certinho, não gostava
de falatórios. Só que desta vez mesmo antecipando
o casamento não teria como escapar dos falatórios
quando o nenê nascesse quatro meses depois.
E assim foi. Nascimento, surpresa, risos, lágrimas, questionamentos
e aceitação. Afinal criança é alegria
E, não poderia ser diferente.
Ele era uma pessoa de poucas palavras e demonstrava mais seu amor
por atitudes.
Preferia dar uma rosa à dizer eu te amo. Este era seu costume.
Por isso era frequente colher uma pequena rosa no jardim de uma
senhora amiga e ofertar à mulher do que falar sobre os
sentimentos.
Assim foi por muitos anos. Nasceram outros filhos. Os dois sempre
juntos. A vida era corrida. Ambos trabalhando, quatro filhos,
compromissos profissionais, familiares, rotina esta que era suavizada
pelo apoio constante da sogra dele e uma tia.
Juntos enfrentaram perdas, mas seus laços eram muito fortes.
Mesmo com os anos passando o hábito de dar flores à
mulher continuou. Por amor ou por hábito não saberia
dizer, porém considerando seu modo de ser, deveria ser
por amor. Todas as quartas-feiras ele trazia na hora do almoço
uma rosa que ela colocava em cima do balcão da sala e só
colocava na água ao voltar à noite, pela exiguidade
de tempo. Muitas vezes, só no outro dia. Outras, até
esquecia. No início festejava. O beijava e agradecia. Depois,
só agradecia, outras nem dizia nada. Afinal, era rotina.
Certa vez ele reclamou pelo fato de ela não ligar para
as flores. Defendeu-se dizendo que levava uma vida muito corrida.
Apesar de trabalhar fora, só contou com uma auxiliar nos
primeiros anos de casada. Então, cozinhava, cuidava das
tarefas escolares dos filhos, de seu trabalho que demandava complementação
em casa. Ele não via isto como justificativa plausível,
mas continuou por mais um tempo trazendo a rosa, embora tivesse
lhe dito em tom que parecia de brincadeira, que se continuasse
a não dar mais importância para a rosa, nunca mais
lhe daria flores. Interessante que ele trazia uma para ela e colocava
outra na sua mesa de trabalho no escritório. Ele mesmo
se presenteava.
O tempo passou e a advertência dele mostrou-se real e não
brincadeira. Uma quarta-feira ele veio de mãos vazias.
Nunca mais lhe trouxe flores. Ela reclamou, mas ele mostrou-se
indiferente ao apelo. Hoje ela desejaria ganhar uma rosa nas quartas-feiras...
O ditado de que só se dar valor depois que se perde algo
mais uma vez se confirmou.
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