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André Luiz Rodrigues Pinto
São João da Barra / RJ

 

O grande pássaro da restinga

 

Conversando com meu amigo Getúlio Alvarenga, que é serventuário da justiça, aposentado como Tabelião e que também atua como Presidente do Sindicato Rural de São João da Barra, numa roda de amigos tomei conhecimento, num feriado festivo de São João Batista, em 2009, de uma história para lá de engraçada, acontecida nos idos da década de 1960 que se tornou um verdadeiro conto! 
Getúlio me contou que certa vez foi caçar nas imediações da estrada do poço (estrada que faz bifurcação com a estrada do Bairro de Fátima), próximo ao "Porto Escuro", em São João da Barra, no Rio de Janeiro,, juntamente com seu amigo Manequinho - que veio a ser pai de nossos amigos Nhonhô Sapateiro e Grapette. Animados, os dois levaram com eles os apetrechos da caça como pios, cordas, facas, iscas, munições, pólvora e as suas espingardas.
Foram para a aventura num fusquinha verde. Descendo do carro, caminharam por uns cinco minutos para dentro da mata de restinga nas imediações do "Perigoso". Estando entocados numa moita - num período em que as matas sanjoanenses eram totalmente virgens - viram uma garça branca e gorda de dar dó, à mostra, nidificando em uma das árvores de copas fechadas do bosque da restinga. Ali se espreitaram e esperaram que a mesma voasse para poderem atingi-la com um tiro certeiro bem na cabeça - que coisa antiecológica! - Foi dito e feito!
Miraram na garça e quando ela voou...fogo! Acontece que no momento dos tiros, estava passando bem próximo daquela direção, em voo rasante, um avião de reconhecimento da FAB, que começou a dar voltas nas imediações do matagal de restinga onde Getúlio e seu comparsa estavam entocados e haviam desferido os tiros no bichano! A partir daquele momento, os dois morreram de medo, correram para se esconderem ainda mais na mata fechada sem ter qualquer medo de jararaca-pico-de-jaca, ouriço-cacheiro, formiga cortadeira ou qualquer outro bicho que fosse, sem contar com os gravatás, cipós e cactus com seus espinhos. Esconderam suas armas e suas munições enterrando-as na areia e não sabiam o que fazer.
-Será que esse piloto acha que somos comunistas? - Indagou um ao outro.
O avião da FAB, por sua vez, conseguiu pousar na estrada próxima de onde os dois se encontravam escondidos. O pouso foi feito em uma clareira retilínea, ainda de terra e com alguns buracos arenosos que seria a futura BR-356, mas o avião, mesmo assim conseguiu pousar, tudo pela maestria do oficial-piloto.  Deu a entender para os dois, que o piloto ia na busca de seus inimigos armados que tentaram derrubar a sua aeronave, um bem das Forças Armadas da União.
Getúlio, bem cabreiro, tomando a decisão de ir em direção ao piloto que já havia visto os dois caçadores já sem armas e apetrechos agachados na moita, foi caminhando lentamente até que o piloto se identificou e disse para Getúlio que estava pousando, em situação de emergência no local, por causa do pouco combustível de sua aeronave. Depois daquela declaração, veio logo o alívio. Getúlio, em retribuição de socorro, retirou de seu fusquinha verdinho um galão de gasolina azul, que na época era vendido nos postos e servia também para aviões e deu ao piloto, que muito o agradeceu em nome da Pátria amada. Dali, decolou e seguiu rumo pelos ares cumprindo sua missão. 
Getúlio volta para o mato e segurando os risos, começa a gritar pelo companheiro Manequinho que estava mais escondido na moita do que "Tatu Peba quando foge do fogo", com medo do ocorrido e com medo de Getúlio ter ido buscá-lo para ser interrogado pelo piloto da FAB também. Getúlio gritou por Manequinho várias vezes e em várias direções, até que Manequinho saiu da toca daquela mata fechada cheia de cobras e lagartos, caminhou bem devagar e com jeito matuto, sem dar um pio sequer, indo ao encontro de Getúlio. Ao explicar a Manequinho que tudo não passou de um susto, ao voltarem para pegar os armamentos e as munições, Manequinho, sem jeito , pergunta para Getúlio:
- Você tem alguma bermuda de reserva no fusca, que me sirva? Tô todo cagado!
Ambos caíram em gargalhadas e... naquele momento, eis que a garça branca e gorda passa voando novamente, indo fazer ninho em outro canto! 
Graças a Deus, erraram o tiro!

 

 
 
Conto publicado no livro "Contos Fantásticos - Edição 2016" - Setembro de 2016