Primeira vez neste site? Então
[clique aqui]
para conhecer um pouco da CBJE
Antologias: atendimento@camarabrasileira.com
Produção de livros: cbje@globo.com
Contato por telefone
Antologias:
(21) 3393 2163
Produção de livros:
(21) 3547 2163
(21) 3186 7547

Isabel Cristina Silva Vargas
Pelotas / RS

 

Confissão interior

               

           Percival nasceu próximo ao mar. Vivia com a família em uma pequena vila entre a cidade e o mar. Pobre desde o berço. A mãe não tinha estudado. Mal sabia escrever seu nome. O pai cedo abandonou a família, o que fez com que todos fossem trabalhar desde pequenos, ele, a irmã mais velha e o irmão mais novo.
          Esta situação gerou revolta, o que o tornou uma pessoa muito amarga, contestadora e briguenta. O fato de colocar dinheiro em casa para o sustento de todos, o fazia pensar que não devia satisfação a ninguém. Cedo abandonou a escola. Fazia de tudo que surgia para ganhar algum dinheiro com o intuito de ajudar Dona Judite e os irmãos.
          Pescaria era um de seus entretenimentos. O outro era o futebol. Ambos favoritos.
          Adorava ir pescar no mar, na lagoa. Quando os pescadores o convidavam para sair de barco, nem pensava duas vezes.
           Viveu a infância e a adolescência entre essas duas atividades enquanto não estava trabalhando na mercearia fazendo pacotes, entregando recados, colhendo flores para vender na missa de domingo ou nas ocasiões festivas.
           Lá pelos seus dezoito anos conheceu Amarílis, uma linda jovem morena que logo tomou conta de seu coração.
           Como não tinha emprego fixo foi tentar a sorte no clube de futebol da cidade.
Como tinha certa habilidade ali ficou contratado o que lhe rendia um salário. Casou-se com Amarílis e teve dois filhos. Assim viveram durante uns cinco anos até machucar-se seriamente, tendo que parar de jogar futebol.
          Sem emprego caiu na bebida, sem se importar com a esposa que sofria e com os meninos.
           Restava-lhe a outra paixão para desafogar as mágoas. Em todos os momentos que podia pegar o barco de seus companheiros de infância, o fazia e ficava ao mar durante horas a fio e, também, a beber. Por vários meses assim ficou, vivendo à margem, desgostoso com tudo, sentindo-se injustiçado. Não percebia o que tinha de mais valioso, sua família.
           Em meio à solidão em um dos momentos que estava embarcado, sob o efeito da cachaça que não abandonava, sonhou com a esposa, jovem formosa, delicada que vinha cobrar-lhe uma atitude diferente, para o bem de ambos e dos filhos. Em seu sonho que virava pesadelo ela o interpelava e dizia-lhe que iria abandoná-lo e a seguir desaparecia, assim como aparecera, envolta em uma nuvem azul espiral.
           Apavorado com a situação ele via-se no mais profundo desespero e confessava a ela todo seu amor.
            Era uma confissão intensa, silenciosa, saída do mais profundo de seu ser, desesperado pela força de seu amor.
           Depois de acordar e sair do torpor que se encontrava, percebeu que deveria dar outro rumo em sua vida para não perder de vez o controle da situação e perder a esposa.
           Decidiu procurá-la, abrir seu coração e tentar colocar no caminho certo o barco de sua vida.

 

 

 
 
Conto publicado no livro "Contos Fantásticos - Edição 2016" - Setembro de 2016