Maria Rita de Miranda
São Sebastião do Paraíso / MG

 

A pedinte

 

           

          - Me dá uma moeda, moça?
         A senhora que passava pela praça da cidade virou-se e deparou com uma jovem de aspecto saudável que repetiu o pedido. Dona Maria parou e resolveu assuntar com a garota.
          -Qual o seu nome?
          - Alessandra. -Respondeu ela com uma voz meio esquisita, resultado da língua presa.
          -Você, uma jovem tão bonita e forte, não trabalha?
          -Ah, senhora, minha história é mais ou menos assim... Posso contá-la?
          -Sorte sua que hoje eu estou com tempo e paciência. Vamos lá.
          -Eu não sou daqui. Venho de uma cidade vizinha. Morava com meu pai e minha madrasta. Desentendi. Juntei o que tinha e rumei para cá. Quando aqui cheguei, já de cara, um rapaz se interessou por mim. Não me fiz de difícil. Aceitei a corte e fui morar com ele. Ele cata latinhas vazias de cerveja. Logo nos primeiros meses engravidei. Tenho uma linda filha chamada Gisele. Ela já está grandinha e é muito esperta. Tem também sua irmãzinha, a Geisy, um nenê gorducho e chorão.
          Só então Dona Maria percebeu uma barriga protuberante resultado de um parto que há pouco acontecera.
          -Eu amo estas crianças e é por isso que me tornei pedinte. Ainda não consegui trabalho e o que o meu marido ganha não dá. Hoje recebi a notícia de que minha madrasta vem morar comigo. Separou-se de meu pai. Quando ela chegar, vou lhe pedir que cuide das meninas. Aí vou trabalhar mesmo, porque quero deixar uma herança melhor para as minhas filhas. Minha mãe foi pedinte e eu herdei isto dela. Não quero que minhas meninas sigam o mesmo caminho.
          Quando deu por si, dona Maria já estava com o braço em torno do ombro de Alessandra. Comovera-se com aquela jovem mãe que contou sua história, com um brilho nos olhos, sem demonstrar revolta. Era uma vítima da vida.
          Separou-se da moça prometendo ajudá-la. Seguiu seu caminho na certeza de que aprendera mais uma lição. Muitas vezes, ela que tudo tinha, reclamava da vida. Alessandra, menina desprovida, pedinte de rua lhe ensinara que a felicidade é um estado de espírito, que pode existir mesmo no infortúnio, que está ligada à nossa convicção daquilo que somos e nem sempre se encontra nas coisas materiais.
          Tempos depois, ao ouvir o trinado da campainha de sua casa, dona Maria vai atender, Para seu espanto lá estava a Alessandra com as duas meninas. - Ah, é a senhora!
          Dona Maria quis ver as meninas de perto. Crianças lindas e saudáveis. Então se lembrou de que tinha retratado, num pequeno texto, o encontro anterior com Alessandra. Pediu que a jovem se sentasse no banco que ficava na varanda. Pegou o caderno surrado e leu para ela uma pequena parte de sua vida.
          Foi aí que dona Maria teve a certeza de que Alessandra era mesmo uma jovem sensível, pois, ao terminar de ler, levantou os olhos e a viu enxugando duas lágrimas que teimavam em rolar sobre sua face.

 

 
 
Poema publicado no livro "Contos de Verão"- Edição Especial - Fevereiro de 2017