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João Paulo Hergesel
Alumínio / SP

 

Eliana

Houve um momento, na entrevista coletiva de emprego, em que a psicóloga nos perguntou: “Quem você considera um herói?” Diante disso, começaram os clichês: “Meu pai, que foi cangaceiro!”; “Minha avó, que levava água até o sertão!”; “Dom Pedro I, que nos tornou independentes!”; “O dono desta empresa, que é um homem sério, culto e responsável!”. Quando chegou minha vez, disparei: “Minha heroína é a Eliana!” e recebi os olhares mais assustadores possíveis, como se eu cometesse um crime inafiançável por venerar uma apresentadora de televisão.
Não posso discordar de que meus pais foram verdadeiros guerreiros por terem me colocado no mundo e suportado tanto sufoco comigo; que minha avó foi uma batalhadora por cuidar de um bebê chorão que só sabia pedir suco de banana-maçã; que o dono da empresa foi um notável conquistador, pois conseguiu transformar uma lojinha do interior em um grande império empresarial... Porém nenhum desses se compara à Eliana.
Ai de meus pais se souberem desse meu pensamento... Ai de mim! Mas se formos elencar os motivos, quem era que me fazia companhia toda manhã, ainda que pela tevê, enquanto todo mundo saía para trabalhar?, quem transformava minhas lágrimas infantis de mamãe-já-tô-com-saudade em sorrisos inocentes?, quem foi que me ensinou a dizer “por favor” e “obrigado” e a usar tesoura sem ponta?, quem até hoje tira o tédio dos meus domingos e diverte meu estresse com quadros interativos e humor inteligente?
Os olhares continuavam ameaçadores, e eu fui obrigado a repetir: “A Eliana.” A psicóloga deu uma chacoalhada de cabeça e me fitou ainda incrédula. Especifiquei: “Eliana, a apresentadora, a loira, a dos dedinhos, ex-patotinha, mãe do Arthur, ex-esposa do João Marcelo, ex-cunhada da Maria Rita, nova madrinha do Teleton...”
Alguns riram baixinho; outros faziam cara de bravos, como se eu estivesse levando tudo na brincadeira. A psicóloga mantinha a pose de psicóloga, indecifrável, mas que talvez fosse uma amostra de que estava gostando. Só que não estava. Não me contrataram. Alegaram que sou adulador demais e deram o cargo ao rapaz que escolheu o dono da empresa como resposta.

   
Publicado no livro "Contos de Outono" - Edição Especial - Junho de 2015