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José Antonio Silva Santos
Rio de Janeiro / RJ

 

Tens o dom de iludir

 

      Numa cidadezinha no interior do Estado de Minas Gerais, nasceu uma linda menininha com fartos cabelos loiros e olhinhos verdes, recebeu o nome de Maria Luiza, era única menina entre três irmãos e vários primos, isso a tornava muito especial na família. Com o passar dos anos, ela percebeu e passou a tirar vantagens por ser a princesinha da família, todos os meninos faziam as suas vontades, na escola ela era disparada a aluna mais bela, sempre era escolhida para ser rainha disso ou daquilo. Na adolescência, e já morando numa cidade grande, aprendeu a usar a sedução como meio para se dar bem, era comum ver os garotos disputando quem pagaria o seu lanche, e os de melhor condição financeira ganhavam a sua atenção.
   Maria Luiza se envolveu com um homem casado que lhe cobria de presentes, lhe proporcionava jantares em hotéis de luxos e passeios maravilhosos, apesar de só ter quinze anos de idade. Não demorou muito para a jovem anunciar ao amante a sua gravidez, ele reagiu muito mal à notícia, disse que não poderia assumir aquele filho e que o melhor a fazer era interromper a gravidez, decepcionada a princípio concordou, então ele lhe deu uma pomposa quantia em dinheiro e desapareceu de vez. A quantia recebida foi suficiente para comprar uma casinha bem aconchegante na cidade, que lhe foi vendida abaixo do preço, por um antigo admirador.
    Maria Luiza conheceu um homem chamado Elias, que lhe ofereceu muito mais que prazeres efêmeros, pois pretendia torná-se seu marido e pai da sua filha. Ela não deu muita importância a princípio, pensou no porque aceitar a ter um homem se poderia ter todos que quisesse, mesmo assim resolveu conversar com sua família sobre a proposta, e as opiniões para que ela aceitasse foram unânimes. Maria Luiza pensou na filha e resolveu aceitar o pedido de casamento.
   O casamento foi realizado com a presença dos parentes e amigos, estranhamente, ela pediu ao marido para que se afastasse quando os amigos dela fossem cumprimentá-la, alegando que eles não ficariam à vontade com ela como sempre fizeram, o domínio dela sobre ele era tamanho que ele concordou sem contestar. No baile, incentivados pelo efeito do álcool, Maria Luiza era levantada no colo enquanto dançava, era um cochicho no ouvido para cá, um beijinho no pescoço para lá, tudo em meio a imensas gargalhadas. A família do marido assistia a tudo aquilo boquiabertos, ao mesmo tempo em que lançavam sobre ele os seus olhares de reprovação.
   Em pouco tempo, a casa deles virou ponto de encontro nos finais de semana, sempre com muita comida e muito mais bebida. Acontecia de tudo ali, até casais utilizando a cama do casal em pleno evento, depois apareciam como se nada tivesse acontecido. Algumas mulheres casadas usavam a casa deles para encontros extras conjugais, geralmente nas manhãs em que a filha de Maria Luiza se encontrava na escola. Já os amigos dele, como não cederam às investidas dela, foram afastados pelo próprio amigo, que acreditou nas calunias de sua mulher, que os acusou de assediá-la sexualmente.   
   Maria Luiza abusava da passividade do marido, a ponto de levar um colega para morar na casa deles por um tempo, alegando que ele precisava dar um tempo da esposa, pois a mesma era muito chata e estava sufocando o seu amigo. Elias várias vezes ao chegar do trabalho, encontrou sua esposa tomando cerveja na companhia do amigo, o rapaz, de banho tomado e sem camisa, se esparramava no sofá. Enquanto ela, praticamente nua, não se intimidava com a presença do marido, algumas vezes até pedia para ele voltar na rua para comprar alguma coisa pra acompanhar a cerveja, e assim acontecia, ele comprava até mais cerveja e se juntava a eles. Não demorou muito para ela se cansar de brincar de dona flor, e tratou de criar uma situação para Elias expulsá-lo de casa.
   Havia um homem em especial que tirava o sono de Maria Luiza, ela não havia tentado nada porque nunca conseguiu perceber interesse da parte dele, e também por ele ser casado com a sua prima Alice, não era comum esse tipo de preocupação, mas ambas foram criadas desde pequena pela avó materna, e sempre houve muita amizade entre elas. Alice contava para a prima os seus momentos ardentes com o marido, sem saber que estava alimentando os desejos secretos dela. Decidida a ter aquele homem, ela ligou para ele num final de tarde pedindo que ele passasse na sua casa para tratar de um assunto de suma importância, então após sair do trabalho ele se dirigiu a casa dela. Ao adentrar no recinto, percebeu que um jantar romântico havia sido preparado, e para sua surpresa, ela o convidou a sentar-se a mesa, ao mesmo tempo, lhe entregou uma garrafa de vinho para que fosse aberta. Ele quis saber o motivo de tudo aquilo, então ela lhe disse que o jantar era de agradecimento, houve então um momento de silêncio, ela continuou, eu te agradeço por você me fazer sentir mulher novamente, por despertar em mim a paixão e o prazer, mesmo que sozinha. Ele simplesmente levantou-se e caminhou até a porta, antes de sair, virou-se e disse que ninguém nunca iria saber o que aconteceu ali, e se foi. Maria Luiza não desistiu, aumentou ainda mais a vontade de conquistá-lo, tanto fez que ele sucumbiu aos seus encantos. Depois, ele que era o objeto dos seus desejos, se transformou num objeto descartável.
   Maria Luiza o expôs para as amigas como um troféu conquistado, até que o ocorrido chegou aos ouvidos de Alice, que não perdoou o marido e o expulsou de casa. Elias soube do ocorrido através de Maria Luiza, que contou a versão de que estava sendo assediada pelo marido da prima, e que não contou antes por tentar protegê-la. O marido como sempre acreditou e a defendeu.
   Maria Luiza não via maldade nas suas condutas, enganar para ela significava conquistar, isso fazia parte da sua natureza, ser mãe e esposa, foi uma consequência que a vida lhe ofereceu, não foi sua livre escolha, na verdade ela só era perfeita para uma situação, para iludir, esse é o seu verdadeiro dom.  

 

 
 
Conto publicado no livro "Contos do Vigário e outras Picaretices" - Julho de 2016