Ismar
Carpenter Becker
Rio de Janeiro / RJ
Gênesis
Estava Elesbão repousando em Jardim Paraíso,
na aprazível Terra dos Papagaios, após ingerir um
cozido regado de bastante cerveja. Balançava na rede de
sua varanda recluso em sua solidão e no balançar
adormeceu. Quando acordou sentiu uma dor, seria fígado?
Na verdade tinha perdido uma costela e a sua frente surge uma
mulher.
Elesbão olhou aquela formosura, bela morena, cabelos compridos
que cobriam as nádegas, olhos cor de mel, seios fartos,
sinal de nascença. Ele elevou o pensamento, sentiu uma
fisgada e logo veio a dor; se lembrou que estava depauperado,
deixou para mais tarde.
Perto dali, num pé de acerola, uma cobra surucucu observava
o casal com sua língua eletrizada.
A vida transcorria normalmente, até que numa sexta-feira
treze, a cobra tentou Jurema (agora mulher de Elesbão);
fez com que a jovem fizesse um suco de acerola, tomasse e oferecesse
a Elesbão que a princípio resistiu, mas ingeriu
a vitamina C apesar de o Criador um dia já ter avisado
para não tocar naquela árvore mesmo estando com
sede.
Sua vida mudou, começou a ter dificuldades, filhos, levantar
de madrugada, tomar duas conduções, dívidas,
aborrecimento no trânsito e com o patrão, brigas
familiares, chegava em casa e Jurema cheirando à cebola
com rolos de bob na cabeça.
Anos foram passando e o entusiasmo em Jurema já não
era mais o mesmo; ela velha, cheia de celulite, ele com aquela
barriga de cerveja preta, a rotina consumia a união; lazer
muito pouco, de vez em quando iam a praia de van, mais precisamente
ao Piscinão de Ramos.
Filme só na TV, a missa ainda ia, só não
gostava do padre que falava sempre que um tal de Elesbão
desobediente foi expulso do Paraíso e agora todos tinham
que pagar Imposto de Renda. E assim foi a vida do casal, depois
Caim matou Abel, vieram os faraós, a 1ª Guerra Mundial,
a 2ª Guerra Mundial, surge a globalização,
internet. Nas Terras dos Papagaios surge Bolsa Família,
mensalão, corrupção, Cheque Cidadão,
futebol, povo feliz ganhando salário mínimo e Elesbão
arrependido de tomar suco de acerola.
Só de ver a fruta na feira livre passa mal.
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