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Isabel Cristina Silva Vargas
Pelotas / RS

 

Vidas paralelas


Ela o conheceu na adolescência. Moravam próximos um do outro.
A amiga dela, colega de escola era apaixonada por ele. Coisas da idade e que não prosperou além de olhares cúmplices. A amiga mudou de cidade, lá conheceu alguém durante o ensino colegial, que se tornou seu marido.
Suzana fez o colegial e entrou para a faculdade. Lá, entre os colegas, estava ele. Tornaram-se amigos. Faziam grupos para estudarem juntos em ocasiões de provas, trabalhos. Pura amizade.
Rodolfo era um tipo bonito, com cabelos claros e olhos verdes. Galã da turma. Namorador, boêmio, mas mesmo assim arrumou uma namorada com quem casou após terminar o curso.
Suzana também tinha um namorado com quem casou três anos após a formatura.
Ela e Rodolfo estudaram juntos para concursos durante o tempo de aula e mesmo depois de formados.
As horas de estudo valeram para sua aprovação. Ingressaram em uma mesma instituição. Ela trabalhando em sua cidade e ele em outra. A família dele continuou morando na mesma cidade. Só ele ia e voltava diariamente.
A vida seguia seu curso natural, mas eles não se perderam de vista totalmente, pois os filhos estudavam na mesma escola. Encontravam-se, esporadicamente, e trocavam algumas palavras.
O tempo passou. Quase vinte anos após a formatura ele veio trabalhar no mesmo lugar que Suzana. Ele precisava se adaptar às novas condições, ser treinado e ela ofereceu-se para fazê-lo, o que ele aceitou de imediato, devido à amizade que nutriam um pelo outro.
Começaram a trabalhar sempre muito próximos. Descobriram afinidades não percebidas anteriormente. As confidências por parte dele começaram a jorrar como água da fonte, clara, forte, cristalina para quem estivesse disposto a decifrar aquela aparência de eterna alegria. Era infeliz. Casara quase que por interesse. A esposa dele era de família bem abastada. Ele imaturo, narcisista só olhava para o próprio umbigo e para suas necessidades. Por se sentir insatisfeito traía. Mas não encarava como traição, pois encontrava sempre uma justificativa dentro de seu raciocínio egoísta.
Separou-se da mulher. Tudo confidenciava para Suzana, que sem perceber ia se deixando envolver pela conversa, pelos desabafos, que a envolvia pouco a pouco como uma teia. Ela se sentia carente.
Ele sempre fora uma pessoa sedutora e gostava da amiga. Cobria-a de elogios por estar sempre a ajudá-lo.
Quando ela se deu conta estava perdidamente apaixonada por ele. Rodolfo nem desconfiava de nada ,se percebia , disfarçava, pois não queria complicações maiores em sua vida. Eram só amigos, ela casada, todos conviviam em alguns ambientes.
Outro motivo era pelo fato de ele ter outra há vários anos, às escondidas.
Suzana sofria. Não sabia o que fazer. O que pensar. Amava sua família. Não queria bancar a ridícula em revelar um sentimento para alguém que só tinha olhos para si mesmo seus problemas, suas conquistas.
Quando a separação dele foi decretada, ele que já tinha saído de casa, saiu em férias e quando voltou contou que estava com a outra, mas sem assumir nada publicamente.
Sua necessidade de orientação cessara e ele, então, distanciou-se de Suzana.
Ela, mesmo sabedora de tudo que ele confidenciava, sonhava que após a separação ele pudesse dizer-lhe que estava apaixonado por ela o que, talvez, a incentivasse a cometer uma loucura, mesmo sendo uma pessoa fiel, dedicada e que gostava de tudo certinho. Afinal, zelava pela sua reputação, pelo bem dos filhos e da família.
Suzana achou por bem calar aquele amor platônico e não correspondido.
A sua decisão foi como um suicídio. Matar alguém dentro de si é uma tarefa de extrema dor. E ela sofreu sozinha. Não tinha com quem compartilhar. Seguiu sua vida morrendo a cada dia. Tornou-se uma pessoa amarga por dentro, revoltada, triste.
Enclausurou-se. Até que percebeu que adoecera e que precisava reencontrar em si aquela outra pessoa alegre, feliz, dedicada, de bom-humor e, generosa que era.
Já tinham se passado dez anos desde que se afastara do convívio com Rodolfo.
Só melhorou quando desenterrou aquele amor nas sessões de terapia e se libertou para sempre.




   
Publicado no livro "Seleção de Contos Premiados" - Edição Especial - Junho de 2014