|
|
Luna
Di Primo
Uberlândia
/ MG
O
galo ciscador
O causo
que narro, agora, ocorreu numa velha fazenda mineira, onde acontecem
os encontros de violeiros e amigos. A festança iniciava ao cair
da tarde e varava a madrugada esperando o raiar do dia. Eram truqueiros,
sanfoneiros, violeiros, contadores de causos e algumas mulheres na cozinha
a preparar os comes e bebes que corriam as mesas. É, porque tem
mulheres truqueiras, também, assim como violeiras, sanfoneiras...
Enquanto isso, as meninotas passavam os olhos pela rapaziada, arriscando
um namorico.
Para garantir o salvar da ressaca da noite não dormida, é
de costume, lá pelas tantas da madrugada oferecer aos convivas
uma farofa e um caldo de galo. Ali, não se fala em caldo de frango
ou de galinha. A sustança está no caldo do galo que fica
cozinhando, enquanto todos se divertem.
Numas dessas festanças, lá pelas dez horas, sol a pino,
estava uma turma à sombra de pés de manga, na porta da
cozinha. Bem próximo observei um velho galo penso, que rodeava
todas as galinhas que se encontravam no terreiro, ciscando à
volta de cada uma, mas nada fazia, além de tentar escapar de
uma carijó que saía a bicar em cada uma que ele rodeava.Curiosa,
dirigi-me ao dono da fazenda a perguntar o que acontecia com aquele
galo que rodava, rodava ciscando em volta das galinhas e nada fazia,
ao que ele respondeu:
- Esse aí, durante o dia é o famoso rufião, só
rodeia e cisca que cisca em volta dessas galinhas, mas nas madrugadas
é o famoso comilão. Só que, como é erado,
cada noite sobe numa, disse, soltando uma divertida risada e acrescentou:
- Esse aí não dá mais de uma por dia não.
E assim, começou a contar que esse galo rodeava todos os poleiros
com as portas abertas. E afirmou que as portas já ficavam abertas,
propositalmente, para que ele entrasse e ciscasse. Que as galinhas adoravam
aquele ciscado. Ciscava num poleiro, ciscava noutro e a carijó
ia atrás com seu cacarejar que parecia dizer: - eita, que galo
peste e seguia pra todos os lados avançando nas outras.
O galo ciscador era um galo já erado, mas igualmente assanhado.
Elas também já eram eradas. E aquele galo tinha um quê
de encanto sobre elas. Talvez o cantar insinuante, como: - Eu subo em
você! Eu, ainda, consigo me equilibrar nas suas costas, parecia
dizer provocante.
E lá se vai o galo galã, assim chamado por ser dono de
um grande charme. E a essa altura da conversa, já percebida pela
turma, que em silêncio acompanhava o diálogo e de olho
no galo, fizeram a pergunta: - Qual será a dessa noite? Arriscavam
apostas pelo ciscar, mas era difícil saber. Qual será
a sua eleita, se todas elas afeitas? Riam. E a carijó, atrás,
a única que ele nunca subia, disse o anfitrião. Intrigados
perguntaram por que o galã nunca subia naquela e tiveram a resposta
que, a tal carijó era cheia de escândalos a bicar em qualquer
outra e o era dado à discrição e silêncio.
- Que se atrevam as outras a aceitarem o ciscado desse galo velho...
Disse, arrematando, o entusiasmado dono.
- E, daí, o que acontece? Alguém queria saber mais.
- Acontece, como acontece com todos nós, bichos, responde o festeiro,
gostando de contar seu causo. Vence o mais forte ou poderoso ou a briga
se torna infinda. As outras são espertas, esperam a calada da
noite e o calor que chega na volta dia, quando a carijó não
se aguenta, pois sofre de moleza. E lá se vão as espertinhas
namorarem o velho galo ciscador que virou galã. Mas, para todos
os efeitos, ele só come à noite, arremata com outra gargalhada. Porém, alguém
chega dizendo que aquele galo seria o 'tira ressaca' daquela noite e
o dono mais que depressa, em meio aos protestos dos, já conquistados
fãs do galo ciscador, que agora era galã, disse um incisivo
não. E justificou, a todos que, ele era galo velho, mas era galã.
Para os presentes não teve nada melhor, caíram em gargalhada
e todos se divertiram com esse causo, a se contentarem com uma canja
de galinha pra noite ou madrugada. Afinal, o velho galo ciscador, que
agora era galã, merecia ser o rei naquele terreiro e continuar
ciscando.
|
|