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Daniel Alves Marques
Itaparica / BA

 

Derrota


Se eu não estou no fundo do poço eu devo crer que não consiga chegar até lá com vida, pois o que estou sentindo agora é simplesmente insuportável. É um mau que neutraliza minhas forças, é um câncer chamado tristeza que absorve o meu sistema imunológico permitindo a entrada da depressão muitas vezes aguda, levando-me ao coma imaginário, estado que impede a medicação.
Eu não sei navegar no sentido e no propósito da palavra, mas eu estaria dando-me por vencido, finalizando uma luta cujo tempo é a minha própria vida. Seria cruel tal afirmação, ignorar os louros mesmo discretos. Eu ainda possuo as armas e a habilidade para manuseá-las, eu sou apenas um guerreiro com a batalha perdida, exausto e com os pensamentos confusos.
- Como tomar decisões ou como chegar a conclusões?
Preciso sair da postura em declínio, aprender a navegar e pôr minha vida na rota certa, pois concluir uma história num único ponto de vista seria mentir parcialmente. Toda vida tem autos e baixos, uma vitória ou uma derrota invictas fazem da fonte informativa não confiável.
Estou no êxtase da vida, com risos inexplicáveis e contagiando os mais imunes dos mortais. No ensejo procuro aguçar todos os meus sentidos, meus passos seguem o sol, às vezes descalços buscando o contato com a terra, peito nu ao vento, ao som do mar e canto dos pássaros, eu passo por uma sessão de terapia, e ao caminhar na praia repleta de irmãos ou no sossego da unidade sinto paz e felicidade.
Ora o tempo é cruel, grafite, frio e molhado com nuanças entre desejos, afinal a tempestade é necessária, mas no geral é negativa; ora o tempo é claro ainda que à noite, desde que a lua imite a louça do nobre esfomeado, e ao dia o mar e o campo de manhã e à tarde sejam os cenários.
Ora o trabalho que não dá certo, as apostas erradas, os buracos no caminho, o inimigo oculto, a saúde debilitada; ora o riso da família, o encorajamento duma mão próxima (amiga), o superior divino ao seu lado.
Com tantos oras constrói-se uma vida, verdadeiramente vivida, na alegria e na tristeza. Com tantos oras aprende-se a distinguir o bom e o ruim, o bem e o mal, a conviver com derrotas e vitórias, a respeitar o diferente, a cultivar sentimentos e distingui-los, escolhê-los e ter ciência dos seus efeitos. Com tantos oras na vida aprendemos a ser seres humanos.
Finalmente a conclusão do intensivo de rota da vida que não seria a certeza do paraíso, mas a condição de poder manusear o timão com destreza e assim estar preparado para o mar que vier e mostrar que derrota também é a trajetória de uma embarcação.

 

   
Publicado no "Livro de Ouro do Conto Brasileiro Contemporâneo" - Edição Especial - Agosto de 2014