José Faria Nunes
Caçu / GO

A saga da insignificância

 

Venho de longe, de séculos, talvez milênios.
Venho da mistura de raças, mistura
de tempos, de templos, mistura
de modos e de mundos, mistura
de tudo e do nada que sou.
De primeira hora posso ter um pé
na África, outro na Ásia, por fim
da América sou mais filho. De Bering
ou do Atlântico, da ibérica península
ou dos porões negreiros da mãe África . . .
O que importa? O resultado de tudo isso
e mais que isso, nada mais
que mero registro numérico de estatísticas
sem cor e sem rosto, apenas parte
de número maior eu sou. Objeto
da disputa pró-dízimo pró-urna, apelo
publicitário. Sem coração para amar.
Cérebro? Para quê? Os marqueteiros
pensam por mim. Basta-me atender
ao mercado como força laboral ou objeto
de consumo. Vivo pelo mercado
e para o mercado. Sem voz, sem vez,
sem alma, sem cor, apenas uma cifra a mais,
capricho na gangorra, pingente, se hoje
choro, o esquecer me consome
no existir de qualquer amanhecer.

 

 

 
 
Poema publicado na "Nós & Eles "- Edição Especial - Janeiro de 2017