Maria Rita de Miranda
São Sebastião do Paraíso / MG

 

 

Vou pedir pra você ficar

 

           

        Adolescência... Época de muito riso, muita prosa e muita crítica entre as amigas de nossa turma inseparável. As conversas eram embaladas por músicas românticas. Não faltavam long plays, principalmente Ray Connif ou compacto do Moacyr Franco, Ronnie Von, Roberto Carlos e tantos outros que arrancavam suspiros das meninas da década de 1960.
          De repente, me vi completamente extasiada com a voz de um negro gordo e feio. A princípio guardei só para mim que o admirava. Era praticamente inconcebível uma garota se apaixonar por alguém, se bem que pela voz, com um tipo físico tão fora dos padrões. Mas aquela voz possante me fazia crer que sairia somente de um corpo avantajado. Pessoa e voz se confundiam: Tim Maia.
          Aos poucos fui deixando transparecer minha preferência por ele. As pessoas próximas a mim riam e criticavam. Eu não me incomodava. Também o reconhecia sem atrativos físicos, mas seu canto me encantava a ponto de assistir a todos os programas de TV que ele aparecia. Tenho uma lembrança remota de vê-lo, durante certo período, cantar com um livro, talvez a bíblia, erguido por uma das mãos. Nunca soube o motivo disso, talvez passasse por fase espiritualista.
          Foi assim durante muitos anos. Bastava aparecer o Tim na TV ou alguma música dele no rádio e tinha alguém chamando minha atenção com certa ironia. Levava tudo na brincadeira.
          Lembro-me com tristeza do dia em que assistia a um programa de tevê que ele apareceria. Entrou no palco, pegou o microfone e começou: “vou pedir pra você ficar”... Parou. Tentou recomeçar. Parou. Estava se sentindo mal. Saiu do palco. Depois a notícia de sua morte.
          Há alguns anos tive a oportunidade de ler o livro “O som e fúria de Tim Maia” de Nelson Motta. Aí me certifiquei do gênio difícil, de algumas manias, deboches e irreverências do cantor. E de como ele era respeitado no meio musical.
          É, eu estava certa. Aquela voz inconfundível continua viva. Até hoje nas festas suas músicas são tocadas. E não é que alguns cantores tentam dar um tom parecido ao de Tim? Sua vida, repleta de altos e baixos foi transformada em teatro musical e filme.
          Se Elvis não morreu, acho que Tim também não!

 

 
 
Poema publicado no livro "Pé de pato, mangalô, três vezes!!!"- Edição Especial - Junho de 2017