Ana Rosa de Oliveira
Recanto das Emas / DF

 

 

O redemoinho

 

           

        Todos param a prosa e acompanham a dança sinuosa do vento.
           De terreiro em terreiro, um a um foram marcados por aquele pião poeirento que a cada giro, a cada volta ficava mais volumoso, mais amedrontador.
            Assustadas, as pessoas em vão corriam a fechar portas e janelas e tudo era tão rápido que não se conseguia evitar o rastro de poeira, folhas secas e restos de construção.
            Ainda se podia ouvir o latido agoniado do cão, porém, nada havia a ser feito enquanto o bichinho assustado era carregado junto a tampa da caixa d'água que naquele momento se assemelhava a um óvni, daqueles que estamos acostumados a ver nos filmes de ficção.
            De repente, a tampa foi arremessada ao longe e muita gente correu em direção ao suposto local da queda para resgatar o animal.
            Naquele momento, veio à minha lembrança a imagem de minha avó.
            Ela não perderia a ocasião pra nos contar uma das suas, costumava dizer que no meio de um redemoinho morava um Saci muito travesso e às vezes, para assustar ainda mais os medrosos, dizia que se o redemoinho fosse muito grande, era onde o "tinhoso" se escondia para levar consigo aquelas pessoas que descuidavam das orações, sendo criança desobediente então, ele tinha gosto em levar...
           Medrosa, eu rezaria fervorosamente por dias seguidos enquanto durasse a lembrança daquela conversa, rezava logo ao acordar, as vezes se o medo apertasse a qualquer hora do dia até me sentir confiante novamente.
           Seu Zezinho desceu a ladeira apressadamente ansioso por saber o destino de seu cachorrinho e mesmo algumas horas depois os curiosos ainda seguiam na mesma direção querendo saber o que de fato estava acontecendo uma vez que ninguém tinha voltado trazendo qualquer notícia que fosse e eu também me juntei ao grupo levada pela mesma curiosidade.
           Ninguém estava preparado para se deparar com aquela cena: alguns já cansados sentaram no    chão, outros procuraram uma sombra por rala que fosse para se abrigarem do calor enquanto no meio do lago de aguas mansas, a tampa da caixa d'agua   girava vertiginosamente como se movida por motor bem potente.
           Aquilo já durava horas, desde que foram arremessados ao chão, o cachorro fazendo o mesmo movimento freneticamente até a exaustão, depois dava uma pausa e retomava perante a plateia assustada.
           Uma pessoa sugeriu que o levassem para casa, mas ninguém tinha coragem de tocá-lo, nem mesmo o dono.
           Assim ficamos ali, embaixo do sol quente à espera de que algo acontecesse. E de fato aconteceu - a tampa parou bruscamente, do lado de cá, o cão interrompeu a pausa, deu uns pinotes e saiu rodopiando!
           Cruz Credo! Dissemos em uníssono enquanto nos benzíamos três vezes seguidas
            E o cachorro? Esse ninguém mais viu e toda vez que um  vendaval se aproxima é uma correria geral, há quem jure ouvir o ganido do cachorro saindo do meio do poeirão, há quem jure...

 

 

 

 
 
Poema publicado no livro "Pé de pato, mangalô, três vezes!!!"- Edição Especial - Junho de 2017