Otaviano Maciel de Alencar Filho
Fortaleza / CE

O ataque da perna cabeluda

 

 

As lendas urbanas não dão trégua e vez por outra elas ressurgem em locais e épocas diferentes. A lenda da Perna Cabeluda é originariamente pernambucana, dos anos 70. Porém ela ressurgiu em Fortaleza no final dos anos 80 e começo dos anos 90. A tal “perna cabeluda” causava grande alvoroço por onde passava. No município foi registrado casos nos bairros de Mondubim e José Walter.
Segundo os relatos ela perseguia as pessoas, assustando-as e provocando agressões contra suas vítimas.
Aproveitando a “onda”, uma dupla de vigaristas resolveu aprontar com os cidadãos. Confeccionaram uma vestimenta, que mais parecia um grande saco feito de um tecido escuro e felpudo com um furo no alto, para que pudessem olhar. Um dos pilantras ficava na cacunda do outro e se cobrindo com o “manto da assombração”, que em ambientes onde a luz fosse escassa ninguém duvidava que fosse algo do “outro mundo”, ou mesmo a tal “Perna cabeluda” e saíam pelos arredores pregando peça nas pessoas incautas, subtraindo-lhes os pertences.
Eis um desses surpreendentes relatos:
                 Já passava das três horas da madrugada do domingo, quando Lúcia e Edineia, retornavam às suas residências, depois de terem passado a noite se divertindo no forró.
Enquanto caminhavam até o ponto de ônibus, onde aguardariam o coletivo que as levariam de volta a suas casas, iam conversando alegremente:
- Mulher, estou “morta” de cansada, aquele homem com o qual fiquei na noite de hoje só queria estar dançando. – Disse Lúcia, bocejando.
- Querias o quê mulher? O cara pagando tudo pra nós, Tu tinha mesmo era que dançar... e muito! O macho que eu arrumei era mais fraco que “caldo de pedra”, fumava tanto que parecia uma chaminé ambulante. O miserável mal pagou duas cervejas e já queria dar uma “saidinha”. Pode um negócio desses? Foi por esse motivo, que não quis sair com ele, mas por ele ser tão “pão duro”, que eu lhe dei um fora e fiquei com vocês na mesa. – Falou Edineia, dando uma risada extravagante.
- Edineia, passou ontem na televisão que um homem foi atacado pela Perna Cabeluda e o coitado foi parar no hospital depois de ter levado uma surra dela. – Comentou Lúcia.
- E tu acreditaste nessa conversa mulher? Isso é coisa de gente querendo amedrontar as pessoas. Isso é conversa de Trancoso! Perna cabeluda que eu conheço só a perna do Sandoval, o meu vizinho. O miserável tem as pernas tão finas e tão cabeludas que parece patas de caranguejo. - Tascou Edineia, dando nova gargalhada, jogando os cabelos para trás.
   Quando transitavam em um estreito beco que dava acesso a avenida principal, local onde as amigas esperariam o coletivo que as levaria de volta as suas casas, de longe avistaram algo que lhes chamou a atenção. A pouca luminosidade do ambiente impedia que elas identificassem o que realmente era aquilo que se encontrava a aproximadamente cinquenta metros de distância do local em que elas se encontravam. A estranha figura foi se aproximando, enquanto as amigas, assustadas e com as pernas tremendo mais que “cipós de vara verde”, tentavam divisar o rosto do indivíduo que aparentava ter aproximadamente dois metros e meio de altura.
Quanto mais perto o indivíduo chegava, mais aterrorizadas as mulheres iam ficando. A distância foi diminuindo e a forma do ser foi se delineando, mostrando um corpo sem cabeça e sem membros superiores e todo peludo. Em uníssono som gritaram:
- É a Perna Cabeluda!
- E agora, meu Deus, o que vamos fazer? - Falou Lúcia, desesperada.
- Corre mulher, senão ela vai pegar a gente. - Gritou Edineia, apavorada!
- Tu disseste que não acreditavas que ela existia, mulher? – Acrescentou Lúcia.
- Mudei de ideia, cunhã. Se isso que está aí na nossa frente não for coisa do capeta, de Deus é que não é! – Falou Edineia aterrorizada.
As duas saíram em desesperada correria e a entidade seguiu atrás. Em determinado ponto do trajeto elas foram alcançadas pela estranha figura que lhes deu um pontapé nos traseiros, levando-as a caírem no chão, ficando desacordadas por pequeno lapso de tempo.
O sol já estava raiando quando as amigas retornaram à consciência e constataram que haviam tido suas bolsas roubadas. Logo surgiram alguns transeuntes que as ajudaram a levantarem-se do chão. Um senhor que passava por perto, vendo a situação das duas mulheres deu-lhes uns trocados para que elas pudessem pegar o coletivo até suas residências.

 

 

 
 
Poema publicado na "Seleta de Contos de Autores Premiados"- Edição Especial - Janeiro de 2017