Rozelene Furtado de Lima
Teresópolis / RJ

 

 

História esdrúxula

                

         

Margarida uma mulher exótica, com olhos verdes da cor do mar, cabelos ruivos cacheados e longos, boca grande e dentes pequenos. Quem passava por ela olhava duas vezes e alguns paravam para admirar aquela beleza singular.  Ela vivia numa briga constante com o espelho por não conseguir enquadrar-se em nenhuma classificação. Parecia que tinha sido feita com sobras de material, um pouco da mãe, um pouco do pai, um pedaço da vó materna, um tico do bisavô e sabia-se lá retalhos de quem mais. Sentia-se assim desde pequena e sempre ouviu a expressão: “como você é diferente!”, mas acabou se conformando com sua aparência física, embora muitas vezes sentia-se como se fosse de outro planeta, um ser estranho, o último de uma espécie extinta. Não era feia era esquisita. Ainda mais incomum era a capacidade de raciocínio rápido e lógico, considerada como gênio.
        A natureza é altamente compensadora, não deixa nenhum ser desamparado, dá ferramentas para que possa construir a própria vida e ser feliz, é preciso reconhecer e tomar posse dessas ferramentas e tirar muito proveito delas. Ser feliz é o objetivo principal da vida.
       Conheceu um rapaz excêntrico com olhos de chinês, cabelos loiros, boca pequena, queixo alongado e de estatura alta. Os dois se aproximaram, penso que por terem aparência incomum.
       Uma tarde de Primavera, ela estava sentada numa praça que tinha um caminho sinuoso em torno de toda praça e com uma bordadura de margaridas grandes e lindas. Gostava de margaridas, até porque era seu nome. Achava-as lindas!
       A margarida é uma flor com pétalas brancas alargadas e delgadas rodeando botão central que é amarelo. É conhecida como a flor que decide o destino de um amor (bem me quer e mal me quer); as margaridas são semelhantes àquele tipo de pessoa encantadora e irresistível. 
       Ele aproximou-se sentando ao lado dela. Entre alguns olhares analistas os dois permaneceram em silêncio. Até que ele levantou-se colheu uma flor e entregou a ela. Rapidamente, ela em voz alta, começou a arrancar  pétala por pétala da flor e dizendo alternadamente a expressão: "bem me quer" e "mal me quer". Quando chegou à metade das pétalas ela disse: -: "bem me quer", e imediatamente passou a flor despetalada pela metade para ele, que continuou com o ritual e na última pétala soou um emocionado "bem me quer". Soltaram uma gargalhada e ele levantou a manga da   camisa branca de malha que usava mostrando o ombro onde tinha tatuado um linda margarida. Ela achou tudo muito amoldado muito encaixadinho com arranjos perfeitos e preferiu não falar que seu nome era Margarida.
       Conversaram um pouco sobre nada que comprometesse aquele encontro inesperado e intrigante. Por fim ele perguntou: - Você vem sempre aqui? Sim, quase sempre, antes da aula de artes. Aliás, preciso ir, está na hora da aula.  Respondeu ela e saiu em seguida. Até outra vez.
       Chegando a casa, pensando no encontro, concluiu que aquele rapaz já deveria conhecê-la de algum lugar. Foi uma pegadinha e resolveu passar um tempo sem ir a aquela praça. Estava se sentindo desfolhada tentou sepultar aqueles momentos de encantamento na certeza que não era bem me quer  era mal me quer.      
       Coisas incríveis acontecem sem precisar fazer nenhum esforço e mais interessante é que parece que a vida é um grande teatro sem ensaios e com personagens em papeis definidos. 
       Dias depois, saindo da aula de artes ela passou pela praça e lá estava ele. Ele só notou a presença dela quando ela estava ao lado dele. Esperei por você todas as tardes e amanhã acabam minhas férias e tenho que viajar hoje à noite.  Queria muito rever você, disse ele. Ao que ela respondeu: - pensei muito e senti também vontade de revê-lo. Conversaram um pouco e ele perguntou o nome dela. Meu nome é Margarida, mas todos me chamam de Meg. Emocionado ele falou: - meu nome é Helioanthus, sou chamado de Hélio. Qual o significado do seu nome? - Perguntou ela. - É girassol em latim. Se você quiser podemos formar um lindo jardim, ele completou. Ela sorri e responde: - Um dia ainda vou provar  matematicamente que  no  universo  não existe nada ímpar tudo e todos tem um par.
       Os dois juntos formam um casal tão exótico que tem pessoas que pedem para fazer uma foto com eles. Separados era muito difícil viver como uma pessoa desigual, juntos passou a ser muito engraçado.
        A história não termina como um conto de fadas “viveram felizes para sempre”, mas aceitaram a ser felizes sempre.

 

 

 

 
 
Publicado no Livro "Bem-me-quer, Malmequer" - Edição 2018 - Março de 2019