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Romilton Batista de Oliveira
Itabuna / BA

 

Sobrevivente esperança

Tudo começou quando ele tinha cinco anos. Seus pais logo cedo perceberam que ele era especial. Então passou a lhe dar uma atenção mais preciosa. Seu nome era Esperançoso. Esperançoso Compostela de Oliveira. Tinha um irmão de nome Timidez. Timidez quase não abria a boca, vivia sempre pelos cantos com seus silêncios clandestinos. Até que um dia ficou sem voz de vez. Quem muito não usa a sua voz acaba perdendo-a. Timidez perdeu a sua voz por falta de uso. Seus pais tentaram de tudo para que ele falasse, mas ele só falava quando queria.
Mas voltando-nos a Esperançoso. Já este falava até demais. Dona Feliciana e Seu Feliciano eram os melhores pais do mundo. Num certo dia eles ficaram doentes. Ambos foram diagnosticados pelo médico como portadores de uma enfermidade sem cura. Esperançoso entristeceu-se, mas nunca perdeu a esperança de ver seus pais curados. Dirigindo-se à farmácia avistou um acidente com uma criança que caminhava pela rua distraída e foi pega de surpresa por um feroz cão que a mordeu deixando-a bastante ferida. Esperançoso ao se aproximar da pobre criança a tocou, socorrendo-a do feroz animal que ao vê-lo correu assustado como se tivesse visto um homem estranho aos seus olhos. Aconteceu a primeira cura feita pelas mãos de Esperançoso. A criança teve suas feridas cicatrizadas em apenas cinco minutos. A compaixão do pequeno menino que tinha um dom especial salvou a criança de uma futura e grave doença, pois provavelmente ela não se salvaria, pois o cachorro que a mordeu várias vezes tinha raiva e havia matado alguém neste mesmo dia com o seu ataque de feroz animal.
A notícia se espalhou por toda a cidade e o menino passou a curar muitos enfermos sem mesmo saber que estava curando. Seus pais foram também curados da doença que os mataria e seu irmão passou a falar desenfreadamente virando um grande orador da cidade. E via no irmão um irmão muito querido e reconhecia que a sua vida teve outro rumo quando ele foi curado por seu irmão.
Seus pais abriram uma igreja sem nome e sem pastor, liderada por todos aqueles que desejavam ser curado de algum mal. Esperançoso não cobrava nada por seus feitos, pois ele sabia que era um dom gratuito de Deus e como o recebia gratuitamente não cobrava nada pelo que fazia. Era a sua missão na terra: ajudar e curar os necessitados e subalternos que viviam sem paz e harmonia. Apenas quando a pessoa era curada de algum mal ele dizia a mesma frase que ele aprendeu biblicamente com seu Mestre: “Vá e não peques mais”. As pessoas só eram curadas quando não praticavam mais as suas atrocidades, as suas más atitudes. As doenças e as más convivências humanas eram resultados de desobediências e práticas maléficas praticadas pelos homens doentes. Esperançoso percebia que havia diversos tipos de enfermidades, cada uma escondia um pecado ou comportamento desviante praticado por aqueles que não viviam dignamente, ou seja, aqueles que viviam de acordo com os seus desejos e sentimentos de ódios que vinham de lá de dentro de seu mundo interior estragado pela maldade.
Esperançoso pregava a cura da alma humana através do distanciamento dos humanos do sentimento que mais agregam no corpo doenças incuráveis: a corrupção. Os homens nos dias de hoje se corrompem facilmente. As pessoas sempre procuram dar-se bem na vida, mesmo que seja de forma agressiva e corruptível. A humanidade tem avançado muito e vem atingindo um progresso tecnológico e filosófico como nunca na vida se viu, mas esta mesma sociedade está sendo facilmente contaminada por discursos capitalistas e individualistas, levando o homem ao completo vazio espiritual através de suas escolhas.
Um dia Esperançoso foi procurado por um político local de nome Lalu, um coronel muito conhecido em seu país. Este homem o confessou que ele era infeliz porque ele tinha tudo, mas lhe faltava ao mesmo tempo tudo. Sofria de “corrupção clandestina”, uma doença que corrói a alma e estraga o corpo, distanciando o homem de sua primitiva imagem, dando-lhe uma máscara de homem “salvador da pátria”. Ele não dormia bem porque o “leco-leco” o impedia de enxergar a vida com a suavidade da verdadeira dignidade. Leco-leco era uma voz que o perseguia todas as noites quando ele ia se deitar, um “morcego psicológico” que lhe visitava e baralhava suas ideias, impedindo-lhe de ser o que deveria ser. Ele era realmente um homem que ocupava uma falsificada imagem de bom patriota em seu país.
Esperançoso nada pode fazer para salvar o homem desta enfermidade, pois era mais que uma enfermidade, era uma deformação irreparável de sua conduta humana, um defeito de ordem cognitiva e espiritual, doença que infelizmente não tem cura, pois a alma foi contaminada pela cobiça maior que destrói definitivamente a consciência humana. Pensava Esperançoso consigo mesmo: Se nossos políticos soubessem que o que eles desviam do povo adentram em suas vidas como moléstias carnais e espirituais, cravando em suas almas um grande e irreparável dano, que os atormentarão pra sempre seu estragado mundo interior, mundo vazio, ocupado por sombras e inevitáveis enfermidades da alma.
A esperança de sermos mais que vencedores está em sermos prestativos, honestos e intensamente dominados por uma força que nos deixa vazio de nós mesmos e cheios de uma potente força maior que só sente quem sabe servir e quem sabe ser servido, acumulando dentro de si, uma inesgotável riqueza que homem nenhum pode nos dar. As atitudes nos tornam grandes, e nesta grandeza deve viver a humanidade. A esperança é a única que sobrevive diante de tanta violência que se espalha por toda a nossa nação.


   
Publicado no livro "Contos de Coronéis (ou) Lobisomens" - Edição Especial - Maio de 2014