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Ruandro Knapik
Quatro Barras / PR

 

Liberdade: sou o adulto de mim mesmo!


Meu chefe me disse: sexta-feira que vem preciso que você me represente em uma reunião importante com o governo, no Rio de Janeiro. Era o que eu queria, o governo era peça chave para aquele projeto onde defendíamos tantos ideais, e partipar o representado seria muito legal.
Também era minha chance para conhecer o Rio de Janeiro de uma forma mais calma. Já tinha ido outras vezes de forma muito rápida, desembarcando de manhã e decolando à tarde, vendo a cidade maravilhosa da janela do táxi. Agora, negociara minha volta para domingo perto da hora do almoço arcando pessoalmente com as despesas do fim de semana e estendendo o retorno – um fim de semana carioca para mim. Não tinha muita certeza se seria agradável, nunca tinha viajado sozinho, e não gostava muito dessa ideia. Mas, não quis perder a oportunidade já desenhada.
Acabou a reunião, resolvemos ir almoçar. Eu não conhecia nada e fui convidado a acompanhar os colegas de Brasília no projeto que iam muito ao Rio e que conheciam muitos lugares. Fomos para um restaurante no Leme, beira-mar. Almoço foi ótimo (apesar de eu ter tido meu cartão clonado). Comentei em voz alta ser minha primeira vez no Rio com um tempo para mim e foi uníssono que deveria ir ao Pão de Açúcar – que além de perto da onde eu estava, seria ideal para o fim da tarde. Um sol e um céu azul, temperatura agradável. O mesmo taxi que levou os brasilienses para o Santos Dumont me deixou na Urca. Ouvi os conselhos para não apanhar um taxi logo no estacionamento do ponto turístico (porque seria um assalto disfarçado) e que atravessasse a rua para encontrar o ponto da Urca. Lá seria financeiramente mais interessante.
Subi o bondinho, passei muito medo (tenho pavor de altura) – tomei um sorvete no morro da Urca e desci. Quarenta e cinco minutos. Sob meu silencio, sem ninguém para dividir minhas impressões ou dividir uma foto. Refleti algumas coisas. Me senti solitário. Pensei que o Rio deveria ser conhecido por todo brasileiro. Foi legal.
Já na rua resolvi caminhar um pouco em direção ao bairro de Botafogo. Peguei um taxi em frente a UFRJ e com treze reais estava no velho Othon do centro. Queria ir conhecer a noite carioca, mas não gosto de sair sozinho, de me sentir sozinho. Pedi uma pizza, negociei um city tour com o recepcionista para o outro dia (ele fazia a ponte para uma agencia parceira) e fui dormir. Não gostava de pacotes prontos, mas teria um guia (pago, tudo bem...) para eu falar alguma coisa.
Na outra manhã, café tomado e logo embarquei na van para conhecer melhor a cidade. Entrei, logo vi uns cinco casais argentinos da melhor idade dominando o clima do coletivo, dois casais também dos meus vinte e poucos sentados lá no fundo, e um moço indiano. Éramos dezesseis típicos turistas.
Primeira parada foi o Cristo Redentor. Eu tentando me enquadrar no autorretrato, quando um membro do casal que compartilhava minha idade perguntou se eu queria ajuda para a foto. Agradeci, usei da ajuda e agradeci. De volta a van, descendo, fizemos uma parada no meio do caminho para uma vista da cidade (já que lá no cume tinha neblina e parecia que estávamos no nível do mar). O indiano também ficou tentando se autorretratar, mas ninguém ofereceu ajuda. Depois entendi que era uma timidez pelo não falar Inglês. Eu que conheço o idioma me ofereci e ajudei o moço. Ele sorriu, quebrou um pouco o gelo.
Na Catedral de São Sebastião comecei a explicar para ele o que era aquilo, o que era aquela imagem, o que é um padroeiro e a importância daquela igreja. Vendo que eu falava com ele, os dois casais mais jovens também se achegaram e começamos a conversar. Eu e uma menina meio insegura com a língua fazíamos a ponte com o indiano.
Para resumir nos demos tão bem que almoçamos com o tour, mas logo em seguida já o abandonamos – fomos para Ipanema, curtir. Eu resolvi ir, a ideia coletiva foi: aqui está chato. Não conhecia ninguém dos quatro, iria abandonar o porto seguro que me deixaria no hotel? Sim, iria.
Estendemos uma canga e começamos a tomar uma cerveja e comer biscoito Globo. Já tínhamos nomes: Eu, a Maria e o Niko que eram um casal, e o Lucas e a Mônica que não eram enlaçados, mas amigos – os quatro estavam viajando em função do trabalho e eram do Mato Grosso do Sul. E o Rajammada. O indiano auditor contábil que viajava o mundo ocidental visitando multinacionais – era sua primeira vez no Brasil, naquela carreira iniciante para ele também.
Quantas risadas. Eu estava isento para ser eu e não ter que me preocupar com nada de julgamentos. Andamos no calçadão, compramos besteiras. Rimos muito. Falamos de futebol, de política e logo anoitecido, marcamos a balada na Lapa. As meninas não iriam.
Corri para o hotel, tomei um banho e vesti uma roupa. Voltei para Copacabana onde eles estavam. Nos reunimos e fomos. O taxista já foi dando as dicas para os quatro caras a perigo na noite carioca. Parecia que ele queria ir junto de tão empolgado.
Nós quatro chegamos nos arcos e saltamos. Não lembro quem pagou. Eu falava com o Raj, e o Lucas e o Niko apenas depois de umas quatro caipirinhas. Lapa. Grande solo sagrado da boemia. Tínhamos vinte e poucos anos, todos. Ninguém conhecia nada, mas nos sentíamos em casa de tão bem. Visitamos alguns bares, e paramos num samba.
Eu achei que ia perder o Raj aquela noite, ele não era acostumado com tanta festa. Largou o casaco pelo caminho (e eu vi que era dos bons) – já catei e guardei. E com tantos chopes e caipirinhas depois rimos muito mais. Achamos um grupo de paulistanas que estavam lá sei lá por qual motivo e foi lindo todo o “enamorar”...
Muito aconteceu...
Saí do táxi, ao amanhecer. Lembrança da rápida despedida e do“nos falamos depois, see you later”, e da corrida para a porta do Othon. Do elevador velho e do meu sono.
Acordei – fui a pé e em plenitude para o aeroporto. Provando e saboreando minha vida adulta.
Nunca mais os vi.

   
Poema publicado no livro "Contos Livres" - Edição Especial 2014 - Setembro de 2014