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Romilton Batista de Oliveira
Itabuna / BA

 

Sonho de menino filósofo poeta


Nasceu numa pequena vila da conceituada cidade grapiúna do sul da Bahia um menino de voz mansa e suave que carrega consigo um sonho muito especial. Seu nome era Maiakóvsky Bakhtine Bilac. Um poeta menino muito conhecido por sua capacidade de encantar a vida dos outros com os seus versos singelos. Ele sempre gostou de escrever poesias com o perfil de aroma doce da natureza humana. Era portador de uma capacidade psicológica, filosófica e social sem fronteiras. Sua poesia atravessava híbridas vozes. Escrevia versos como quem bebia água para matar a sede. Mas ele tinha um sonho e uma vontade de potência. Sonhava em ver todo mundo livre de preconceitos. O poeta menino entendia que o preconceito é a raiz de todos os males da humanidade. O filósofo menino acreditava nas diferenças como reajuste da desenfreada desigualdade, e tinha uma idéia fixa na mente de que este dia estava pra chegar. Idealizava uma sociedade de justiça, onde todos deveriam ter direito a direitos, de ter uma educação de qualidade, ter uma saúde eficiente e uma constante alegria produzida nas relações humanas em permanente entendimento multicultural.
O menino poeta também tinha uma vontade de potência. Esta vontade de potência estava presente em seus versos, pois ele escrevia a voz de seus semelhantes, a dor, a saudade, a simplicidade, a sinceridade e tantos outros bons costumes que fazem de um povo um povo vencedor. Sua poesia não se encaixava nem como simbolista nem como parnasiana, nem como moderna nem tão pouco como pós-modernista. Ela era tecida por uma linguagem especialmente trabalhada longe da representação repetitiva presente em tantos poetas brasileiros. Ele escrevia com a alma, e escrevia sem fins lucrativos. Não queria viver economicamente de seus versos, pois se sentia agraciado por uma Grande Força Divina, escolhido para receber as palavras que a humanidade precisa ouvir para alcançar o devido crescimento poético transcendental de forma gratuita. “De graça daí porque de graça recebeste”, este era o seu lema. O menino foi crescendo e se tornou um adulto promissor. O despertar da sólida e coerente poesia cada dia lhe surpreendia.
O mundo mudou, as coisas mudaram, os costumes mudaram, mas o menino adulto poeta continuava escrevendo e distribuindo sua poesia de graça para todos sedentos por vida. A vontade de potência presente em seus versos, a cada dia, fortalecia-lhe, a sua poesia era iluminada por novas formas desconstruídas de suas próprias formas. E o poeta dos sonhos dourados resolveu escrever uma história sobre sua própria vida, revelando ao mundo inteiro o segredo que ele carregava desde menino. E o mundo inteiro queria ler o seu livro. O livro narrava sua vida e sua profunda poesia costurada por uma linguagem nunca vista neste meu mundo de meu bom Deus. E o segredo para que a sociedade viva dias felizes estava no fim do preconceito. Quando libertarmos de nossas fronteiras ideológicas e discursivas, alcançaremos o que a humanidade tanta procura: a paz. Ela, a paz, só pode brotar nos corações que se permitirem desvestir-se de suas preconceituosas ideias, de seus errôneos e ultrapassados fundamentos. O ser humano precisa se desnudar de seus coloniais investimentos, “escavar” o passado e perceber nele o que foi feito por fios horrendos, por ideologias macabras que tiraram a vida de tantos indefesos humanos, de tantas mulheres que foram vítimas do sistema patriarcal, de tantos homens e mulheres que foram e ainda são escravizados por nosso sistema seletivo cartesiano.
O mundo conheceu o Poeta que fez da vida sua filosofia, do verso desarmado seu ofício, da escrita libertária sua transgressão, da denúncia enunciativa sua marca de fé e da extensão de sua obra a todos os subalternos, excluídos do planeta. E a leitura fez novas vítimas, ou melhor, novos filhos: homens e mulheres munidos de uma vontade de mudar o mundo através da poesia.
E o sol nasceu num novo dia. A lua sorriu como uma menina a caminhar por seu grande céu coberto de nuvens camaradas. O vento tocou no chão da terra como nunca antes havia tocado. O mar teve suas águas transformadas e novamente diluídas em novas híbridas cores. As vozes dos rios e lagos alegravam o mar que se agitava porque a nova ordem no mundo se estendia por todos os seus filhos, desde o pequeno menino poeta a qualquer movimento expresso pela natureza que faz do homem seu constante amigo de fé. Os animais caminhavam sem a ferocidade de sua antiga violência histórica. Os dias passaram a ser suaves como a doçura de uma flor que se desabrocha em seu canto de paz, dias cobertos por finos fios de ardentes olhares repartidos. O Éden abria as portas para todas as oportunidades, todas as gentes, de todos os credos, de todas as cores, de todos os sentimentos, de todos os amores, de todos os sonhos, de todas as possíveis escritas, tecidas por leves sons de signos em construção. Nascia um novo mundo, um mundo embalado pela poesia, pela Poética do encanto e desarmamento das armas humanas desumanas. Um mundo cheio de magia e de esperança, porque em se plantando tudo dá. No plantar, no colher, no repartir do pão, no abraço da saudade da partida daqueles que vão e daqueles que chegam, no encontro de águas que se chocam com novas águas, enriquecendo o rio com os seus novos movimentos.
E o menino hoje está velho, mas cheio de experiência para dar, mas jamais vender, porque as boas coisas não têm preço. Ser bom não se mede na balança da virtude ou do bom pagamento. E ele descansou desta vida, muito feliz e realizado, porque deu de si o que ele pode dar até o último dia de sua vida, até a sua preciosa passagem, porque só atravessam a linha do tempo homens e mulheres que conseguem em seu dia-a-dia transformar a vida de outros, oferecendo-lhes não palavras prontas, mas palavras que se constroem com ações que jamais se envelhecem porque elas são palavras que encorajam os humanos a desarmar suas máscaras e a usar sua própria vontade de potência que explode o real que se mostra como falsa imagem de si.
Dizem até hoje que este bom homem ainda vive em algum lugar deste mundo azul, compartilhando sua vontade de potência a todos os homens e mulheres que querem ser e viver como astro luminoso e não como astro iluminado. Só alcançam a real beleza da vida quem se habilita fazer parte desta comunidade de poetas e poetisas, estrelas que iluminam outras estrelas, numa desejada e infinita troca de experiência e plenitude, entendendo que quando se ilumina também é iluminado.

(Homenagem ao amigo William Carvalho, tecido por um fino aço de chão, regido pela forte presença da razão compartilhada, rasgada pela subjetividade sutil dos homens de fé)

   
Poema publicado no livro "Contos Livres" - Edição Especial 2014 - Setembro de 2014