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Marcos Filho
Macaé / RJ

A carta perdida



Macarena é uma tradicional e famosa rua que tem na Bonanzia, que é sustentada pelo comércio e pela presença de turistas do mundo inteiro. As instabilidades do tempo a quatro dias e a frequência dos clientes flutuantes e nativos, vêm preocupando os mercantes que são acostumados com a agitação do mercado local.
Seu Portunhol Santos faz todos os dias o mesmo percurso quando retorna do seu horário de almoço em sentido a sua barbearia que invejavelmente não tem tempo que atrapalhe a chegada de sua clientela. Preparado para a desordem da estação, abre o seu guarda-chuva para se proteger da pluviosidade orográfica e tenta mantê-la erguida sob os efeitos da ventania. Atento a tudo que acontece a sua volta, observa pequenos fragmentos brancos que aos poucos se desfazem e se espalham no céu.
- Será que só eu estou vendo isso? Perguntou seu Portunhol em voz baixa para si mesmo pasmado.
Assim que os pedaços se desfizeram por completo, veio a 10 quilômetros por hora ao chão algo ainda maior em um formato de boliche.
Seu Portunhol um pouco distante de onde caiu, atravessou imediatamente a rua em direção ao local. Ao se aproximar devagarinho, um moço falou;
- Larga isso pra lá senhor. Não tenha medo, é apenas mais um pombo que deve ter sido enxotado pela tempestade. Isso é um perigo, traz até doença! Disse desvalorizando o pássaro.
Seu Portunhol triste com o que lhe era dito, apenas ouviu sem controverter. Seu hobby de ser veterinário, não o deixava acaçapar a sua paixão pelos animais. Resolve então aproximar-se do pombo com o intuito de ver o que está acontecendo e ajudá-lo no que pode.
- Graças a Deus, ele está vivo. Essa palha estava no lugar e na hora certa. Disse aliviado, mas não sabia a empreitada que lhe esperava.
Ao pegar o pombo com cuidado tirando vagarosamente a palha que o cobria, depara-se com o pássaro vestido com uma roupa de sua estirpe e na parte traseira com uma carta em formato de um cone lacrada.
- Cada coisa que eu encontro! Moteja sem acreditar a cena que presencia.
Retoma ao juízo e tenta acudi-lo lentamente para ver se ele consegue retornar a voar.
A queda foi amortecida, mas a sua ação não estava correspondendo. Para cuidá-lo melhor, resolve levá-lo para a sua casa. Uma vez que se deixar o pombo nessa rua, vai virar entulho com as demais caixas e palhas da quitanda já que um moço não mostrou interesse em ampará-lo. Seu Portunhol o enrola novamente na palha e coloca-o em uma caixa de sapatos que encontrou no lixo da sapataria.
- Jordênio Alves, é Portunhol. Não vou poder voltar hoje à barbearia, depois eu lhe explico a minha ausência. Telefonou para o seu amigo e ajudante de longa data.
Em casa, seu Portunhol faz massagens sem pressa a fim de obter as reações desejadas. Tira a roupa do pássaro acompanhada de uma carta, para ele isso podia estar atrapalhando. O pombo se debate, abre as asas, tenta alçar voos e não consegue manter-se. Com as tentativas, ele só declinava. Por não estar machucado graças ao amortecimento que teve, ele avalia as suas asas abrindo-as sempre com cuidado em cada parte que bule. Chegando à conclusão de que a quantidade de pena perdida em sua queda foi o suficiente para impedi-lo de voar. A sua recuperação seria no mínimo de 20 dias, por ter algumas penas camufladas em um tamanho prematuro.
Com a carta na mão, seu Portunhol identifica que se trata de uma correspondência enviada pelo Feudo próximo da cidade Bonanzia para o lugar que só o pombo sabe o caminho. A sua recuperação seria muito importante para que a mensagem chegue ao seu destino e que ele retorne para o seu abrigo.
- Meus pais já me contaram muitas histórias dos pombos-correios. Pombos treinados e que só os senhores feudais tem. Mas nunca imaginaria que um dia eu fosse cuidar e conhecer algum. Pois, de tão alto que eles passam para ninguém os atacarem e desvendarem as mensagens que a elite envia para o destino desejado é quase impossível de velos passando. Seu Portunhol lembra ao ler o endereço da carta: “De: Castelo da Família Feudal, Para: 1826”. Por isso, não vale a pena abrir, por ser anotada por códigos morse. Não sendo possível algum desconhecido da classe decifrar a mensagem.
Passados os vinte dias, é hora de se despedir colocando novamente a excêntrica roupa seguida da importante carta. Aproveitando o momento para tirar mais fotos do pombo com a sua máquina fotográfica lambe-lambe.
Uma coisa importante que o seu Portunhol acha, seria levá-lo ao local que o encontrou. Caso contrário, o pombo não saberia se localizar para continuar o seu trajeto. Repetindo o mesmo horário em que estava retornando do almoço para o seu trabalho. Leva-o exatamente em frente à quitanda, auxiliando-o a alçar o voo. Coloca no chão e nada, ergue com as mãos declinando suavemente para cima e para baixo e nada. Coloca-o no chão em cima da palha e ele começa a se debater um pouco atrapalhado aumentando gradativamente a sua velocidade em sentido ao céu. Desaparecendo-se entre as nuvens.
- Até logo Feudo. Disse seu Portunhol ao chamar carinhosamente o pombo que ele tanto se dedicou e torceu pela sua recuperação.
- Parabéns senhor, não desistiu mesmo. Essa cena foi linda. Mudo os meus pensamentos a partir de hoje. Não devemos mesmo desistir nunca de ninguém. Disse o moço que tinha desvalorizado o pássaro quando caiu na rua.
Com orgulho, seu Portunhol disse:
- Nada rapaz, o que levamos da vida é isso. Ajudar sempre o próximo, até mesmo quando estivermos mal de saúde. Respondeu emocionado com a sua conquista, retomando a sua caminhada.
...
Dizem que o pombo seguiu o seu caminho para entregar a carta que ficou sob a sua responsabilidade. Mas quando retomou o seu trajeto, resolveu procurar pela região o seu Portunhol que lhe deu carinho como ninguém. Hoje, Feudo mora com ele e é uma das tradições da barbearia. Turistas não deixam de passar pelo comércio da tradicional e famosa Rua Macarena sem visitar e tirar fotos com o querido e histórico pombo. O castelo feudal nunca o procurou.

 

   
Poema publicado no livro "Contos Livres" - Edição Especial 2014 - Setembro de 2014