Primeira vez neste site? Então
[clique aqui]
para conhecer um pouco da CBJE
Antologias: atendimento@camarabrasileira.com
Produção de livros: cbje@globo.com
Contato por telefone
Antologias:
(21) 3393 2163
Produção de livros:
(21) 3547 2163
(21) 3186 7547


Romilton Batista de Oliveira
Itabuna / BA

 

Era uma vez

Era uma vez a vez de uma rainha. Herdou seu trono de seu ex-amigo que o passado lhe dera. Ela não era má nem era boa, era simplesmente uma rainha que governava o seu reino de acordo com várias vozes que sustentavam a sua voz. Tinha um nome que lhe fazia mandar de forma severa e altruista. Seu passado a condena, mas o povo que lhe deu a chance de ser a nova governanta era um povo desprovido de uma educação de qualidade. A nação tinha sido fraudada por seu ex-governante, mas mesmo assim o povo que sabe de tudo a elegeu. Seu nome era Dinamitildes Avassaladora da Proteção, e seu antecessor era o famoso Lisura de Fortuna Acumulada. Havia neste país, onde tudo em se plantando tudo dá, muitas colheitas que não eram bem vistas por seu povo obediente. A corrução era a semente mais plantada nesta terra abundantemente rica.
Um dia, ela, a Excelentíssima Dinamitildes resolveu mexer nas leis. Achava ela e seus amigos da Corte que uma mudança precisava acontecer naquele país que já viu de tudo. A Madame levou para a Corte uma nova Lei que criava duas Constituições, uma para o povo e uma para os seus representantes. Segundo a Constituição do povo, os trabalhadores deveriam trabalhar até morrer sem direito à aposentadoria, pois segundo o psicólogo da Corte sábio é o homem que vive de seu suor até a sua morte. Trabalhar, segundo o psicólogo, livrava os sujeitos de adquirirem doenças, além de ser uma atividade lúdica e divertida. Porém a Constituição que dava plenos direitos aos representantes do povo dava-lhes o direito de aposentar a partir de dois mandatos, pois, segundo o filósofo Labaredas de Fogo, justa é uma nação em que os seus representantes políticos precisam se aposentar cedo para fiscalizar o povo em sua inteira vida de trabalho.
O povo aceitou porque Dona Dinamatildes, portadora de um discurso polivalente e contagiante enfeitiçou e contaminou, com essas ideias inconcebíveis, parte avasaladora da população, criando para o povo casas (que mais se parecem como paredes esperando o vento derrubar) e incentivos como “quem mais trabalhar e render terá direito de receber o décimo terceiro salário, quem não render perderia tal direito. E o povo continuou sua cina, cantando, trabalhando e vivendo, como bons cidadãos de Santa Cruz da Esperança.
Poetas, escritores, professores, médicos, advogados, antropólogos, cientistas, sociólogos, historiadores, pensadores e vários seguimentos da sociedade apoiaram a Nova Ordem, pois não queriam se deslocar de suas confortáveis vidas. E o tempo foi passando, passando, quando de repente, um poeta, desses que é filósofo, pensador e crítico da realidade, percebeu que havia algo errado em seu país. Todos estavam de braços cruzados diante das manobras da sábia Rainha. Os impostos haviam aumentados, juntamento os preços dos remédios, do petróleo, da vestimenta, enfim da vida em geral. Algo precisava ser feito.
O então poeta candidatou-se a ser o próximo Rei de seu país. Reis e rainhas em Santa Cruz da Esperança eram eleitos pelo povo e não obedeciam ao formato clássico e hereditário da tradição. O poeta percebeu que havia uma falsa democracia colocada em prática em seu país, e resolveu lutar contra o sistema.
No dia anterior às eleições o poeta publicou no jornal a seguinte notícia:
Homens, mulheres, crianças e idosos são a potente arma da verdadeira democracia. Só vocês podem fazer com que a mudança venha. Mudar é uma atitude de coragem, e só os corajosos podem enfrentar o sistema, desmontá-lo e reformá-lo, criar novas formas de ver, ser e estar. Vamos à mudança!
O povo entendeu a linguagem do candidato, mas infelizmente, ele foi impedido de continuar a sua candidatura um dia antes das eleições. Todos os partidos, juntos, de acordo com as duas constituições resolveram tirá-lo de cena. E o poeta foi preso. Venceu o sistema, e aquele povo voltou a sua rotineira vida, obediente e servidor. O poeta foi exilado, e lá, bem longe de sua terra-mãe escreveu seu novo livro: “Poeta e Povo: potência da palavra”.
Ao voltar do exílio, conseguiu lançar o seu livro, e toda a população leu a sua obra, refletiu, e se levantou contra tudo. Eu, de minha poética janela, vi a mudança acontecer. Vi o povo se levantar, o despertar de uma nação engolir os seus corruptos, beber o sangue de seus criminosos numa voracidade filosófica e científicamente, numa fome pela justiça. Vi uma guerra explodir de canto a canto de Santa Cruz da Esperança. Vi que o povo se libertou da ignorância através simplesmente da leitura, da literatura, da coragem em lutar pelos mais sagrados direitos – o de viver dignamente.
Uma nova Constituição foi feita, e todos, exatamente todos, políticos, representantes, cidadãos forma punidos de acordo com a mesma Lei, viviam, aposentavam-se de acordo com a Social Constituição Popular. A Rainha Dinamatildes foi presa porque foram descobertas grandes desvios de verbas, abuso do poder e envolvimento numa máfia clandestina que empobrecia toda aquela humilde gente. Foi preso também o ex-imperador que enriqueceu às custas do povo trabalhador. E finalmente o povo abriu os olhos e começou a enxergar a corrupção que caminhava a passos firmes. Definitivamente a verdadeira democracia nascia em Santa Cruz da Esperança, e o novo governo, o poeta do povo (como ele era conhecido) governou através da força da palavra, do povo pelo povo para o povo. A poesia transformou a nação, e o povo entendeu que a vida só vale a pena se o povo faz dela um canto de paz.

 

   
Publicado no livro "Contos Fantásticos" - Edição Especial - Maio de 2015