Primeira vez neste site? Então
[clique aqui]
para conhecer um pouco da CBJE
Antologias: atendimento@camarabrasileira.com
Produção de livros: cbje@globo.com
Contato por telefone
Antologias:
(21) 3393 2163
Produção de livros:
(21) 3547 2163
(21) 3186 7547

Helena Maria S. Matos Ferreira
Guapimirim / RJ

Pegadas enigmáticas

Um pescador levantava-se antes dos primeiros raios dourados passarem pelos tufos de sapé de sua cabana à beira da praia. Um dia, ajeitando suas redes e outros utensílios próprios do seu dia de trabalho, colocando-os dentro da canoa, observou pegadas na areia umedecida. Pareciam femininas, talvez de alguém não muito pesado, pois não estavam muito fundas.
Pensou de quem seriam, já tão cedo e solitário ou solitária. Seguiu-as, mas elas desapareciam em determinado ponto, bastante pedregoso.
No dia seguinte o homem do mar resolveu levantar-se ainda mais cedo. Encontrou novamente os rastos, mas não o dono ou dona deles. Achou estranho e, novamente, no dia seguinte, levantou-se ainda mais cedo. Encontrou as marcas, mas o mistério dos pés enigmáticos continuava.
Decidiu, então, o pescador esconder-se dentro da canoa e passar a noite acordado em vigília. E aí descobriu: uma graciosa jovem, muito delicada, caminhando sobre a areia, molhando a barra do vestido de tecido leve, quase transparente. Abordou-a e indagou-lhe o que fazia tão cedo, sozinha, naquele lugar. A quase menina respondeu-lhe que esperava o rei dos mares, que lhe prometera retornar para buscá-la. Explicou para o pescador o quanto ela se apaixonara e que a expectativa a consumia. Disse-lhe também que havia uma grande cidade no fundo das águas e que ele lhe contara o quanto a vida era alegre e feliz naquele mundo.
O pescador achou-a muito insana, mas ele foi mais insano ainda, pois apaixonou-se por ela. Passou a espreitá-la, vendo-a quase diariamente a esperar à beira da praia o tal ser fantasioso.
Até que um dia ele apareceu e arrebatou-a para o tal mundo imaginário.
O pobre pescador entrou nas águas, mergulhou procurando desesperadamente por sua amada. Tempo perdido, ela se fora.
Passou então a vagar pela areia, em busca de pegadas que denunciassem o seu tão desejado retorno. Muitos o viam caminhando na praia, os ombros envergados pelo sentimento de incapacidade. Não pescava mais; o desânimo tomara-lhe posse. Ele não conseguia entender o que havia acontecido. O rei dos mares existiria? E reinaria sobre um povo diferente? E por que a jovem dos seus sonhos se apaixonaria por alguém que não pertencia ao nosso mundo?
Interrogações sem respostas.
O jovem pescador tornou-se um pobre envelhecido à espera de uma solução para o enigma.
A morte colheu-o à beira da praia. A espuma branca trouxe-lhe um pedaço de tecido delicado e transparente depositando-o sobre o coração do homem tão sofredor. Qual uma flor, uma última homenagem para quem muito amou e esperou em vão por uma paixão enigmática. 


   
Publicado no livro "Contos Fantásticos" - Edição Especial - Maio de 2015