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João Paulo Hergesel
Alumínio / SP

Bem que eu me avisei!

Não foi uma coisa boa. Ai, Patatita, Patatita! Não tinha nada que ter me chamado... Eu é que não tinha nada que ter aceitado. Mas vai, ela tá de esmalte azul, tem coisa lá. Maldita testosterona!
— Boa tarde, senhor!
Será que ele percebeu? Ai, não... Ou será que ele também não foi transformado? Não tem como saber. Deve estar agindo como se estivesse. Ai, Patatita! Onde é que você foi se meteu? Eu disse, eu disse para ficar embaixo da escada, eu disse. “Oh, isso dá azar! Sou supersticiosa.” Agora nem aqui está para falar de superstição.
— Como vai?
Droga! Tenho que parar de cumprimentar, senão vão perceber e estou lascado. Mas se eu não cumprimentar também estou. Isso parece um sonho. Aparece alguém para me beliscar, por favor. Hum, que vontade de comer chocolate branco... Droga! Em sonho a gente não sente vontade. Não é um sonho.
— Oi. Oi. Oi.
Será que eles viram a Patatita? Pena que não posso perguntar. Devia existir uma maneira de ler mente. Mas e se eles receberam esse dom? Sabe, não devia ter entrado naquele porão, tinha que ter encarado a situação, fosse o que fosse, nem parece tão ruim mesmo. Só que tive que dar ouvidos à Patatita... Patatita, que nome gozado! Poderia se chamar Pati, como toda Patrícia, mas não, tem que ser diferente. E quis tanto ser diferente que se escondeu mal e agora é bem capaz que esteja igual...
— Tudo bom?
...a esses aí. Gente, estou ouvindo meu coração acelerar! Interessante isso de dizer que a gente ouve o coração, porque não ouve nada. A gente sente o coração, e eu só estou sentindo uma palpitação muito doida que... Patatita. Deve ter acontecido algo de errado com ela. Maldito esmalte azul!
— Olá!
Agora preciso ficar sorrindo e cumprimentando esses transformados. No fundo, ficou até bom como ficou. Todo mundo sorrindo, bonzinho, cumprimentando. Deve ser isso que o tal chip faz. Deixa as pessoas doces... Nanana... E meu chocolate branco? Ai, Patatita! Só de pensar que não sei onde encontrar você, fico com o nanana da música da Marisa Monte na cabeça. Talvez isso seja um sinal de que eu esteja...
— Alô!
Ai, meu deus, que deus-do-céu, que frio na barriga, que deus-nos-acuda, quem é que tá me ligando.
— Patatita?!
Ah, não! Agora vai todo mundo me olhar, vão me ver falando, vão ouvir minha conversa, vão saber que eu ainda sou eu e vão querer que eu seja eles. Será que celular ainda pode? Não vi ninguém no telefone desde que saí do porão. S3M... Ela tá sussurrando isso? Odeio quando ela fala baixo e não consigo ouvir.
— Pata...
Tututu... Desligou. Deve estar presa, com medo, embaixo de uma escada, comendo chocolate branco, nanana, de esmalte azul. Testosterona. S3M. Se eu soubesse, pelo menos, o que isso significa. Parece banda de rock adolescente. Rock, rock, roc, roc. O rato roeu a roupa do rei de Roma. Nanana.
— E aí?!
S3M, se concentra no S3M. Justo eu que queria fazer mestrado, daí a louca da Patatita vai e me orienta a entrar no porão porque um grupo da elite está querendo implantar um chip na mente de cada cidadão para transformar todo mundo em escravo robótico, um robozinho que faz tudo o que mandam, uma máquina com carne e osso. Roc, roc, roc, roc.
— Beleza?
Tudo veio tão tornado dessas séries dos Estados Unidos e tudo foi levado, bombardeado, sei lá. Se a Patatita tivesse ficado debaixo da escada comigo não teria sido atingida pelo que atingiu e não sei o que é que a fez sumir. S3M. O boom do barulho, o xiu do silêncio e o tunquetum da vida de volta ao normal que não é normal porque ninguém mais é normal. Ai, Patatita, se me descobrem aqui!
— Caraca!
Fecha a boca, infeliz, grita baixo que senão já me ouviram. Mas está tão perto, S3M... Agência? Organização? Roc, roc... Coisa secreta? De esmalte branco com chocolate azul. Patatita está lá. Vai pelos fundos, sempre dizem que pelos fundos dá mais certo. Só que e se os fundos forem a frente que já estou olhando, estou nos fundos. Mas e se a placa S3M for só para enganar, e se a Patatita que ligou não é a Patatita, e se eu estou ferrado. Vou chorar.
...
— Rápido! Ali está ele!
...
— Ótimo trabalho, Patrícia! Agora, todos já estão transformados e prontos para segui r o comando da S3M. Até o mais esperto! Nossa emissora de televisão será sucesso de audiência.
...
Boa tarde. Como vai? Oi. Tudo bom? Olá! E aí? Beleza? Boa tarde. Como vai? Oi. Tudo bom? Olá!


   
Publicado no livro "Contos Fantásticos" - Edição Especial - Maio de 2015