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Rui José Bodanese
Pato Branco / PR

Um lugar chamado Esperança

 

Sempre existiu. Ninguém queria ver. Era melhor não ver o tacho da bruxa.
Conta-se que num lugarejo chamado Esperança, o povo vivia muito triste.
Certo dia, tal qual a lua cheia, surgiu nesse lugar um andarilho idoso que, vendo a tristeza de todos, fez uma reunião nas escadarias da igreja. E perguntou:
- Quem não conhece a história da poção mágica?
Todos se olharam admirados demonstrando que já a conheciam. Porém, ficaram em silêncio ouvindo-o dizer:
- Quem não ouviu falar, ou não conhece a história do Tacho da Bruxa, onde são colocados diversos ingredientes para produzir a poção do mal? Uma grande fogueira. Um enorme tacho e, borbulhando, produzindo a essência que vai transformar alguma coisa boa em má?
Ninguém se atreveu a responder. Apenas olhos curiosos e ouvidos bem atentos... E o andarilho continuou contando:
- Invisivelmente, onde se reúnem duas ou mais pessoas, os assuntos são os ingredientes, bem como os fatos, os atos, os boatos, os julgamentos de terceiros ausentes. Ali, sem que ninguém veja, existe um tacho enorme que, a medida em que surgem as fofocas, as mentiras, os problemas, as mágoas, os desabafos, as intrigas, os ciúmes e as invejas, são imediatamente misturados e fermentados até virarem essência maligna. Quanto mais amargurado o assunto degustado, mais concentrada a essência e maior o estrago a ser provocado. No início é até prazeroso degustar esse veneno, mas lá no subconsciente começa a reação contrária, da culpa, do arrependimento e do conflito interior, que fazem germinar a semente da tristeza.
Admirados com as palavras do andarilho, homens, mulheres e jovens que estavam ali sob a claridade da lua cheia, pareciam mudos. Um silêncio total.
Sentindo que todos estavam pensativos, refletindo sobre os ingredientes colocados no tacho, o andarilho fez uma proposta:
- Que tal, a partir de hoje jogarmos fora o conteúdo do tacho da bruxa e nele colocarmos ingredientes bem diferentes como amor, paz, compreensão, respeito, amizade, solidariedade, valorização. E mais, enquanto estiverem mexendo a poção, cada um se policiar e não policiar os outros. Cada um analisar-se e sobretudo reconhecer se em algum momento errou. Se assim vocês fizerem, estarão preparando a Poção Mágica do Amor. Essa sim, não só lubrifica um relacionamento, como nos traz uma paz interior, um estado de espírito elevado por estarmos de bem conosco e com os outros, nos proporciona a conquista de uma resultante que se traduz na boa saúde e na força para suavizar as adversidades, as indiferenças e os conflitos do dia-a-dia.
E o andarilho bem alto continuou:
- Povo de Esperança, paz interior e estado de espírito elevado se consegue em abundância com a essência do bem. No tacho invisível, não importa o tamanho, nem a fogueira para produção de tal essência, é preciso muita compreensão, muita tolerância, muito amor e, sobretudo, muito perdão. Quando evitamos magoar alguém, estamos produzindo essência do amor. Quando ajudamos alguém, estamos produzindo a essência da misericórdia. Quando nos posicionarmos com humildade, estamos produzindo a essência da valorização. Gentileza gera gentileza. Paz gera paz. Alegria gera alegria. Amor gera amor.
A lua já ia alta quando o discurso acabou. Cada pessoa saiu bem devagar, cabisbaixa. O andarilho se enrolou em um cobertor e ali mesmo nas escadarias dormiu.
No outro dia, a notícia se espalhou e, ainda cedo, o povo voltou ao mesmo lugar onde ouviram tão impressionante história. Queriam fazer perguntas. Saber de onde o tal andarilho havia surgido. Porém, o andarilho não se encontrava mais ali. Ninguém o vira partir.
A partir daquele dia, o povo que vivia em Esperança se uniu e pôs em prática a lição que em uma noite de lua cheia aprendeu com o andarilho idoso.
Os dias foram passando e o povo exercitando no tacho do amor. Pelas ruas do lugar, o povo que vivia triste se transformou. Nas faces rosadas só se via o sorriso, paz interior e muito amor.


 

 
 
Conto publicado no livro "Contos de Outono - Edição 2016" - Agosto de 2016