Ismar Carpenter Becker
Rio de Janeiro / RJ

Os cinco sentidos

Nunca mais um sussurro invadindo os ouvidos que aqui jazem surdos
Nem o olhar de uma retina que brilha ao ver as cores da vida
Agora só o cinza impera
Nunca mais a voz doce com palavras angelicais
Nem mais o cheiro das manhãs em campos floridos de um algodão hoje
Amanhã tecido será
No futuro trapo largado ao léu
Nem sentiremos o azedume de uma fruta silvestre
Enjoando estômagos ácidos, destruindo com avidez
Nunca mais as mãos percorrendo os meandros de um corpo
Onde poros exalam o perfume do amor em noites febris
Em alcovas cujas vidraças embaçadas encobrem a paixão
Onde lá fora o frio congelante maltrata a natureza inerte e quase morta
À espera da primavera que teima em não chegar
E o ciclo se fechará
Estas palavras amareladas e roídas por traças ficarão
Em algum livro empoeirado numa estante qualquer
Até virarem cinzas espalhadas por um vento qualquer