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Marcos Antonio Amaro da Silva
São Paulo / SP

 

Em busca de uma segunda chance


Da janela do seu quarto era possível contemplar a beleza do sol ao se entrelaçar com o verde claro das árvores. Era permitido assistir a magnitude das gotas de orvalho que deslizavam pela vidraça de sua janela e assim sonhar com novas oportunidades e desafios.
A sua vida estava impregnada de enganos e desilusões. Não poderia abster-se dos momentos bons que a rodeavam, mas que não eram usufruídos pelos mesmos motivos que a impediam de ser feliz. Estava cansada de ser maltratada e humilhada por sua bondade e apego ao homem que dedicou parte de sua existência.
As suas tardes, mesmo que cheias de sofrimento e dor, eram dedicadas a ele, pois havia prometido, aos olhos do Senhor, amá-lo e respeitá-lo até que a escuridão envolvida e acompanhada pelos braços da morte, apartasse a sua relação.
Infelizmente, os dias foram se passando e aquele homem elegante, cheio de charme e delicadeza havia partido para um lugar sem volta e sem destino. Então, sentindo-se confusa e deprimida com a mudança tão repentina, pôs-se a refletir sobre o porquê desse desconforto em seu casamento. Era o momento de sentar e conversar para decidirem o que estava acontecendo, e sem que ela percebesse ele já não estava mais lá.
Tudo isso foi deixando-a cada vez mais sozinha e angustiada. Portanto, sem que ele percebesse ela começou a segui-lo, o que para a sua surpresa não era algo que estava acostumada a fazer e que a incomodava muito. Mesmo assim, decidira colocar em prática o seu plano no intuito de salvar o seu casamento ou quem sabe viver a sua própria vida, já que não estava mais satisfeita ao lado dele.
Os dias se seguiram e as investidas em tentar descobrir os mistérios que envolviam o seu esposo já estavam chegando a um ponto em que ela não conseguia entender, pois todas as vezes que saía de casa, o encontrava sempre no mesmo lugar e com as mesmas pessoas.
Para a sua surpresa, não havia mulheres. Ele sempre estava rodeado de amigos e bebidas. Não que elas não existissem ou tentassem levá-lo para satisfazer os seus desejos egoístas e vazios, mas o que a incomodava é que ele não aceitava as investidas das mulheres que o rodeavam. Ele simplesmente dividia o seu tempo livre com a bebida.
Parada em frente ao bar, ela não suportou a dor que tanto assolava a sua alma. Seus olhos caíram em prantos e a levaram de volta para casa, refletindo sobre a possibilidade de estar casada com um homem que a traíra, não com outra mulher, mas com a bebida. Era desgastante demais para a sua relação ter de dividir espaço com alguém que não se podia falar, conversar, fazer perguntas e muito menos obter respostas. Ela sabia que precisava ser inteligente e amável com o seu esposo. Na verdade, ele precisava de ajuda imediatamente o que a fazia sentir-se responsável por ele naquele momento de solidão e tristeza.
Domingo à tarde, enquanto as crianças se divertiam com os amigos e vizinhos na pracinha, em frente a sua casa, ela estava na sala lendo um livro quando ouviu o barulho da campainha. Ao abrir a porta, não conseguiu se controlar. Era o seu esposo que estava com o rosto todo ensanguentado, sendo carregado, pelos braços, por dois amigos de mesa de bar. Ela desesperada liga para a casa de sua mãe e pede ajuda. Infelizmente, o domingo não poderia ser pior. Os seus filhos não entendiam o que estava acontecendo e choravam abraçados à mãe, perguntando o porquê daquela cena.
Com o intuito de acalmá-los, criou uma história de que o pai havia se machucado, mas que tudo ficaria bem, pois ele era forte e iria se recuperar logo. Somente ela sabia que era tudo uma ilusão e que o tempo de recuperação dele seria uma incógnita, pois dependia muito mais dele do que dela. Então, sentindo-se humilhada e constrangida com a situação, decidira levá-lo a uma clínica de reabilitação para alcoólatras com a ajuda de sua família.
Após alguns meses de tratamento, ela já percebera a mudança na vida de seu esposo e também na vida dos seus filhos. Ele voltou para casa e permitiu-se a uma segunda chance ao lado de sua esposa e de seus filhos tão amados. Ela já não se sentia mais sozinha, pois o homem com quem casara havia voltado para o seu lar e tornado-se uma pessoa de bem. Todos os momentos de folga do trabalho eram dedicados somente à família, o que a deixava cada dia mais apaixonada e mais feliz.
Assim, continuaram os seus dias, na esperança de querer viver sempre mais, pois a vida não é pra ser vivida pela metade e sim de forma plena. Para ela, a satisfação esteve nas atitudes que tomou durante os momentos em que sofrera e no desejo insano de ser feliz e fazer reviver o amor outrora vivido, portanto, não se deixou vencer pelos obstáculos. Ela foi mulher guerreira e entregou-se às chances que a vida lhe oferecera, tendo como resultado, além da realização do seus lindos desejos, a união de toda a sua família, uma vez desgastada pelo problema do alcoolismo.


   
Publicado no "Livro de Ouro do Conto Brasileiro Contemporâneo" - Edição Especial - Agosto de 2014