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Thaís Cristine Costa Noleto
São Luís / MA

Invasão


Há sempre algo sobre nós que todos desconhecem, talvez um segredo guardado a sete chaves, cravejado no peito, difícil de acessar. Pode ser uma tristeza difícil de curar, tão grande que te impede por vezes de avançar.
Com Amélia não seria diferente...

***
Não te contei, não é mesmo?! Hoje, mais uma vez, ela veio a minha porta; bateu, eu não quis abrir, relutei até que ela desistisse. Ouvi um silêncio profundo. Foi então aí que abri a porta. Lá estava ela, resolvida, pronta pra entrar a qualquer custo, sentada numa cadeira de balanço esperando pra invadir assim que eu abrisse a porta. Ela foi esperta, uma hora eu abriria, com certeza. Não ficaria eu, presa para sempre em minha casa. Sem pedir licença foi entrando, rígida, fria, sem piedade e sem expressão alguma. Por um momento pensei em expulsa-lá como se expulsa um cão asneiro, mas ela me encarava decidida: "- É aqui mesmo que vou ficar!".
Não tive forças no momento para lutar ou esbravejar, tampouco forças para impedir que ela entrasse, quanto mais para permitir que ali, permanecesse.
Já dentro de minha casa, freneticamente revirou todos os cômodos e objetos. Eu sem saber o que fazer e muito fragilizada pedi que parasse: "- Por favor, lhe peço, deixe-me em paz! Saia de minha casa!". Estava tudo desordenado, fora de lugar. Minha casa estava um caos.
A cabeça dava voltas, pensando no que traria aquela tão voraz figura a minha casa.
" - O que queres de mim? Diga o que queres e deixa-me em paz!".
A figura, entorpecida, parou e olhou fixamente em meus olhos, isso me deu um certo calafrio. Nunca tinha visto ela me olhar daquele jeito.
"- Não quero nada, moça! Apenas faço o meu trabalho."
Que trabalho seria esse que desordenara toda a minha casa? Precisava esmurrar a minha porta e entrar sem pedir licença? Eu não estava conformada com tal tratamento, ela só podia estar louca, pensava.
"- Que tipo de trabalho é esse que traz pavor? Por que bagunçar toda a minha casa se nada queres de mim?"
A figura medonha voltou-se pra mim, com ar insólito: "- Quando você expulsa a alegria, abre as portas para que eu entre, moça. E às vezes é necessário que eu faça certa bagunça, pra que você se dê conta de que sem alegria, não se pode viver".
Alegria... Minha amiga Alegria... Brigamos, te contei?! Mandei-a embora, desde então só lamento. Foi aí que Tristeza bateu em minha porta, invadiu minha casa. Se uma não está presente, é aí que vem a outra e se apropria de seu lugar. Miserável, Tristeza!
Depois disso foi embora, estava satisfeita... Me deixou toda uma casa para arrumar.
Vou contar-lhe só até aqui, conto-lhe mais depois. Vou à procura de minha amiga, vou tentar reconciliar-me. Por onde será que anda Alegria?




   
Publicado no "Livro de Ouro do Conto Brasileiro Contemporâneo" - Edição Especial - Agosto de 2014