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Marina Moreno Leite Gentile
São Paulo / SP

O mistério da nota social

Muitas pessoas emigravam para a capital de São Paulo, de todas as regiões do Brasil, além dos estrangeiros vindos de diversas partes do mundo.  Na cidadezinha onde residia um jovem de Cássia, Minas Gerais, não era diferente.   A família do jovem mineiro havia passado dificuldade nas décadas de 1930 e 1940, e forçada a desfazer de bens e propriedades.

Era  início da década de 1950, dois irmãos decidiram ir para São Paulo. Tinham pouco dinheiro e muitos sonhos.  Chegaram à cidade como forasteiros, vencendo as dificuldades com muita luta, inclusive dormiram em banco de praça.  A vida seguiu seu curso, os dois persistiram e cada um fez um pouco de cada coisa. Um deles viu na construção civil a chance de alcançar sua vitória.  Inicialmente começou a trabalhar de auxiliar de pedreiro.  Com o tempo adquiriu experiência para trabalhar como independente.

Certo dia, um simpático senhorzinho, que morava na região do Jabaquara, comentou que tinha a intenção de construir uma casa, pois havia comprado um belo terreno. O materiaj de construção ele poderia pagar em suaves prestações, mas não tinha recursos suficientes para pagar a mão de obra, na condição que os profissionais exigiam.

O jovem construtor então lhe disse que poderia construir a casa,  tão sonhada, e o senhorzinho pagaria como pudesse.  Para o jovem construtor a palavra empenhada era o suficiente para confiar. O  simpático senhorzinho ficou pensativo por alguns instantes, como se estivesse calculando e analisando tudo. O jovem também ficou estático, esperando a resposta, ansioso para conseguir a obra. Seria um trabalho árduo que compensaria. Não demorou muito e o senhorzinho se pronunciou, aceitou a oferta do jovem construtor. Os dois pegaram um papel e o senhorzinho foi anotando  os materiais que deveriam ser comprados.  Dali alguns dias a obra foi iniciada.

Naquela época o jovem construtor se enamorou por uma jovem linda,  vinda do interior de Minas Gerais.  Ela era sorridente, trabalhadeira, vivia o sonho de “vencer na cidade grande”, assim como ele.  Já estava na hora de se casarem, unirem suas forças, tudo tinha que ser direitinho, para não haver falatório.   

Enquanto construía a casa do senhorzinho, passo a passo, ele recebia o pagamento em pedaços, da forma que o senhorzinho podia, sem reclamar. Satisfeito com a oportunidade, o jovem construtor fez tudo a contento. Foi uma das casas mais bonitas, das edificadas por ele. No final da construção o senhorzinho ainda não tinha quitado a importância combinada. Demorou um pouco para receber,  mas o senhorzinho honrou sua palavra, pagou tudo certinho.

Durante a construção, o senhorzinho conversava frequentemente com  o jovem construtor, sobre muita coisa.  Aprendeu a admirá-lo por sua ética,  honestidade,  determinação. Ficou sabendo um pouco da história familiar dele, inclusive sobre a sua intenção de casamento.  Ele já tinha uma casa em vista para alugar, para iniciar a vida de casado, mas  tinha um problema. A noiva necessitava de um lugar familiar e próximo da igreja para se preparar e pernoitar, antes da cerimônia. Os noivos guardavam recomendações importantes da família, só poderiam ficar juntos após o casamento. Eram outros tempos! 

O senhorzinho, querendo agradar o jovem construtor, por ter confiado nele, por ter construído sua casa com carinho e tudo perfeito, ofereceu sua residência para a noiva pernoitar e se preparar para ir até o cartório e igreja.  Além disso, como presente e consideração, o senhorzinho disse que contrataria um retratista e faria uma publicação em  um jornal paulistano, comunicando o casamento dos dois. Recomendou que o jovem construtor, após o casamento, fosse ao jornaleiro tal  e que comprasse o jornal tal. 

O enlace matrimonial aconteceu no dia  8 de setembro de 1952,  na Igreja São Judas Tadeu, Cartório da Saúde. Não houve festa, portanto, após a cerimônia, os noivos seguiram direto para o novo lar.

A nota social do jornal foi vista pela mãe de criação da noiva, no interior de Minas Gerais. O dono da fazenda onde ela trabalhava era um assíduo leitor daquele jornal. A mãe ficou muito feliz pela filha ter se casado direitinho, nos preceitos que fora criada e educada.  

Os noivos não adquiriram o jornal, com a nota social do mais importante momento da vida deles. O senhorzinho que fez a publicação também não, inclusive ambos perderam o contato. Coisas da vida. A curiosidade desta nota social perdura até hoje. 

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Prima Norma, gostei de você ter contado esta história de meu tio Sebastião Augusto Leite e Maria de Lourdes Jordão. Eu a compartilho neste livro,  com a esperança de que alguém consiga descobrir  o tal  jornal  e a nota social.  Quem sabe!

   
Conto publicado no Livro de Ouro do Conto Brasileiro Contemporâneo - Edição Especial - Julho de 2015