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Mauro Cezar Vieira
São José de Ribamar / MA

A verdadeira história da fuga

A fuga da família real para terras tupiniquins é sem duvida o episódio mais pitoresco na história do Brasil. D. Joao VI era um jovem príncipe regente filho de uma rainha louca, casado com uma mulher horrorosa e, principalmente, cheio de indecisões, dizem que até no âmbito da opção sexual. É importante frisar que toda a corte portuguesa foi escoltada por navios ingleses desde a saída de Portugal até a chegada no Brasil. Os ingleses eram a principal aliança comercial de Portugal e D. João sabia que não poderia perder aqueles aliados. Por isso quando o mensageiro chegou no palácio de Mafra, onde morava o príncipe regente, e entregou a mensagem dos ingleses o jovem príncipe tremeu:
- Alteza! Trago a vós uma mensagem direta de Londres. Napoleão está a caminho de Lisboa. Dizem que ele tá bufando porque a gente não aceitou o bloqueio continental!
- Êrra diaxo! – D. João VI nasceu no sertão nordestino se vocês não sabiam. – Cumé que nóis vai fazer agora. – falou o pobre príncipe todo se tremendo.
Apesar de ser cabra da peste, D. João não era muito arretado. Pelo contrário. O carinha era meio medroso – eufemizando a situação é claro – até em discussões com a mulher ele se rendia logo. Talvez por isso ele morasse no Palácio de Mafra enquanto ela morava no Palácio de Queluz com a sogra louca.
- Eu vô ondi minha mãe! Ela vai me dizer o que fazer. – e virou-se pro mensageiro – Podi ir, meu filho. Vá com Deus e se encontrar Napoleão, digue a ele que sou primo de Virgulino Ferreira que o cabra treme logo!
E lá se foi nosso herói conversar com a mãe que, apesar de ser louca, era considerada uma espécie de oráculo pelo seu filho, afinal, os loucos são gênios. D. João entrou em sua carruagem e foi cantarolando. Dizem que ele era um ótimo compositor e escreveu um livro de partituras que foi encontrado por Luiz Gonzaga que ficou famoso cantando “Minha vida é andar por esse país...” numa clara referência a música “Minha vida é fugir pra outro país...”, composta pelo então príncipe regente poucos dias depois de sua chegada no Rio de Janeiro.
Chegando em Queluz, D. João foi ter com a mãe em seus aposentos. Ao entrar ele se deparou com sua mulher deitada na cama da sogra lendo um jornal de fofocas enquanto D. Maria “Louca” andava de calcinha e seios a mostra pelo quarto imitando o som de uma vaca:
- Mõõõõõ... Mõõõõõõõõõõõõ... Mõõõõõõõ!
- Mãe! – chamou João.
- Napoleão! – respondeu ela virando para o filho.
- Deur me livri! Esse macho é do tinhoso, sinhora! E é dele que eu quero falar!
- Pois fale, Agamenon!
- Mãe, ele quer invadir nosso território, cumer nossas cumida, fazer filhu nar nossa muié. O diabaquatro! O que eu faço?
E foi nesse momento que D. Maria I teve a ideia mais desonrosa, mais esdrúxula e mais sábia de sua vida. Dizem que em momentos de dificuldade reconhecem-se os verdadeiros líderes. E quem melhor para liderar uma corte abobalhada do que uma rainha louca? D. João era só marionete. Quem era o cérebro de Portugal era D. Maria. Ela era o oráculo. Ela via o futuro. E para ela surgiu uma música que só surgiria novamente muito tempo depois quando foi gravada por Gilberto Gil e fez muito sucesso. Ela começou a cantar pulando de um lado para o outro:
- Vamos fugir! Pr’outro lugar baby! Vamos fugiiiiiiiiir!
Uma ideia se acendeu no cérebro arretado de D. João e ele rapidamente redigiu uma carta para os aliados ingleses pedindo a proteção para a fuga da corte. Vestiu a mãe e soltou ela no Palácio de Queluz para dar a notícia a toda a corte:
- Vamos fugir! Pr’outro lugar baby! Vamos fugiiiiiiiiir! – gritava ela de corredor em corredor.
Em 48 horas a corte abobalhada de D. João partia para o Brasil fugindo do bando de Napoleão. Apesar de a saída ter sido de madrugada, houve uma grande plateia por conta da cantoria de D. Maria que acordou todos por onde passava:
- Vamos fugir! Pr’outro lugar, baby! Vamos fugiiiiiiiiir! – cantava ela animada a caminho das embarcações.
E assim todos vieram para cá. Deixando seu povo ao léu, jogado. Os portugueses estavam rendidos e entregues à ofensiva francesa.
Quando Napoleão chegou em Lisboa encontrou várias pessoas desesperadas se lançando ao mar enquanto seguiam a cantoria da soberana rainha portuguesa:
- Vamos fugir! Pr’outro lugar, baby! Vamos fugiiiiiiiiir!

 

   
Conto publicado no Livro de Ouro do Conto Brasileiro Contemporâneo - Edição Especial - Julho de 2015