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Rozelene Furtado de Lima
Teresópolis / RJ

 

A garrafada do amor

 

Luiza, Alice e Marina  três amigas inseparáveis, vizinhas, colegas de colégio, frequentavam os mesmos lugares, tinham os mesmos gostos ou se esforçavam para ter. Uma amizade que começou desde pequenas e cresceu com as oportunidades oferecidas pela vida.
Não eram bonitas, ou melhor, não eram atraentes, não chamavam atenção, eram simpáticas, sorridentes, educadas.  Todavia a visão delas só alcançava o círculo entre elas.  Olhavam com seis olhos, viam unicamente o interesse que fosse comum de três.   Um horizonte curto ao alcance das seis meninas moradoras nos olhares.  Todos os segredos, preocupações, compras, passeios, viagens, estudos, festas, sensações e emoções eram compartilhados entre elas. Tudo como se uma dependesse da outra numa relação simbiótica.  Tinham muito sucesso em tudo que faziam, porém não conseguiam manter um relacionamento amoroso por muito tempo, eles desistiam. Isso começou a preocupá-las. As famílias pressionavam por estarem passando da hora de casarem e terem filhos. Por mais que se produzissem, fossem a festas, praias, cinemas e por mais que sonhassem com o príncipe encantado não conseguiam encontrá-lo. Quanto mais procuravam mais eles sumiam.
Nada pode ser comparado a dor de alguém que imagina passar a vida toda sem ter um amor, nem que seja  só na imaginação, um paixão platônica para sonhar e construir castelos  para reinar, aquele príncipe que chega num cavalo branco ou aquela princesa adormecida para ser despertada e desvendarem juntos os prazeres do amor. Elas queriam muito, desejavam demais encontrar ou serem encontradas.
Todo sonho desejado acontece desde que seja declarado ao universo expresso em palavras escritas, faladas ou sussurradas ao vento, se assim for, de alguma forma será realizado. E num dia qualquer conversando num ponto de ônibus uma senhora escutou a conversa das três que comentavam a vontade de encontrar alguém casar, a senhora falou a elas: - Eu conheço um pajé que faz uma garrafada do amor que é infalível! Bebe e fica apaixonado pelo resto da vida. Elas anotaram os detalhes e o endereço e na semana seguinte foram à tenda do tal pajé.  Entraram juntas e contaram o drama que estavam passando. O pajé garrafeiro anotou o nome de cada uma delas, a data de nascimento e marcou a dia para elas buscarem a garrafada do amor e recomendou:  o rapaz tem que beber sem saber que é uma garrafada e pode ser misturada a uma bebida. O resto só depende de vocês.
Elas combinaram de fazer uma festa, inventaram uma comemoração qualquer em família e depois de muito selecionarem fizeram a lista de convidados. Entre eles os escolhidos a dedo por elas, cada um deles reunia as qualidades buscadas num bom marido. Foi difícil, elas eram exigentes!  
Chegou o tão esperado dia, ansiosas buscaram as garrafadas, eram individuais uma para Luiza, uma para Alice e outra para Marina, não podiam trocar, pois quem bebesse ficaria apaixonado pela dona da garrafada pelo resto da vida, e importante:  “o encanto teria o efeito contrário se  o segredo fosse revelado ao apaixonado, quem contasse passaria a mendigar o amor e o que bebeu passaria a desprezar e até agredir a pessoa.
Com muito cuidado e atenção cada uma preparou a estratégia para ter o tão desejado casamento. Foi recomendado que servissem o preparado com um pouco de bebida alcoólica, seria mais fácil de ser consumida, um gole bastava e se fosse tomado todo o conteúdo o resultado seria o mesmo.
É um grande risco querer mudar o roteiro do próprio destino, quem tentou se arrependeu.
Marina preparou a bebida e foi fazer um brinde com o escolhido por ela, nervosa trocou o copo e ela mesma tomou a garrafada do amor.
Alice misturou o liquido no vinho, enquanto esperava oportunidade para servir ao seu preferido colocou em um copo e deixou cuidadosamente num cantinho da mesa e ficou de costas esperando a oportunidade de oferecer a bebida ao rapaz selecionado.  A encarregada da lavagem dos copos pegou o preparado, sem que ninguém visse, bebeu e lavou o copo. Alice não entendeu o sumiço da beberragem.
E Luiza? Perguntei ao meu avô que dizia que era uma história verdadeira.  Ele respondeu: - Luiza, a mais esperta, usou um vestido que tinha bolsos, misturou a bebida com material preparado pelo pajé, colocou dentro de uma garrafinha e ficou de olho no futuro marido esperando o momento certo.
O local ficava próximo a uma reserva florestal e de vez em quando algum animalzinho de pequeno porte aparecia buscando comida.
Gabriel sentou-se na mureta da varanda aberta, Luiza aproximou-se dizendo: Vou pegar uma bebida para você e saiu acelerada, pegou uma dose de uísque e rapidamente adicionou o conteúdo mágico. Voltou sedutoramente e ofereceu a Gabriel que aceitou com um sorriso. Nisso o dono da casa chamou Gabriel para cantar, já que ele era um famoso profissional da música. Ele esticou a mão discretamente e colocou o copo no chão do lado de fora da mureta e foi atender ao convite para cantar e tocar.
Que foi que aconteceu vô? Ele deu uma bicada na bebida antes de ir fazer o show?
- Vamos ver. Luiza estava tão ansiosa que tinha certeza que ele tinha bebido.
Na verdade verdadeira um gambá que é um bicho apreciador de bebidas alcóolicas enfiou o focinho no copo, que era largo, e tomou uma boa quantidade e fugiu feliz.
Terminada a festa, vocês podem imaginar como ficaram as três amigas. Viveram com grandes amores, Marina apaixonadíssima por si mesma, nada nem ninguém mais tinha importância para ela.  Alice teve a companhia de uma senhora que fazia tudo por ela não a largava de jeito nenhum.
E Luiza vô?
 - Luiza passou a dormir com um gambá ouvindo o barulho chxoiu...chxoiu... chxoiu  sem falar no cheiro .

 
 
Conto publicado no livro "A Noite das Garrafadas " - Janeiro de 2016