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José Antonio Silva Santos
Rio de Janeiro / RJ

 

O viajante

No interior de Minas Gerais se encontrava uma cidadezinha chamada Milagres, que mantinha as tradições sertanejas, onde seus moradores se recusavam as mudanças provocadas pelo mundo moderno. Em milagres não havia internet nem celular, existia apenas uma pequena estação de comunicação, onde funcionava um telefone publico e um ponto de distribuição de correspondência, uma espécie de extensão dos Correios. A melhor maneira de chegar ao lugar era através do trem, que também não era muito moderno, lembrava os que trafegavam na Europa nos anos setenta, feito em aço sem pintura, cujo interior era dividido em cabines, havia também um grande salão onde eram feitas as refeições no passado, sendo puxado por uma grande locomotiva pintada de vermelho com listras amarelas.
   Maria Luiza era uma bela mulher casada com José, não por amor, pois era comum os casamentos serem arranjados entre as famílias; eles tinham mais de dez anos de união, mas não tinham filhos. Ela costumava passar suas tardes olhando através da janela da sala, esperando pela chegada do trem, e sonhava com o dia em que o seu grande amor desembarcaria do trem e a levaria com ele para viver uma vida com muito mais emoção.
   Certo dia Maria Luiz fazia suas compras no único mercadinho do lugar, quando encontrou com sua amiga Ruth, que toda eufórica, falou-lhe sobre o belo rapaz que chegou a cidade no último trem, que ele se aproximou dela para pedir informações, querendo saber de um lugar para se hospedar, o que quase lhe tirou o fôlego de tanta emoção. “Nossa que homem cheiroso”, falou colocando a mão sobre o peito e suspirando. Maria Luiza ficou pensando em como seria este homem, então se perguntava “como eu não vi este homem chegar?”
   Era comum os homens saírem para uma caçada duas vezes por mês, seguiam para uma região que ficava a mais de trinta quilômetros de distância, onde levavam um dia inteiro de cavalgada para chegar, passavam mais um dia caçando e mais outro dia inteiro no caminho de volta. E haviam partido naquela manhã.
   Na cidade havia uma única pensão, onde raramente tinha um hospede. Maria Luiza estava tomada pela curiosidade de conhecer o tal rapaz, então procurou Ruth e foi à pensão comprar uns doces, pois lá também funcionava como confeitaria, ao chegarem, viram um homem distraído lendo um livro, então Ruth cutucou Maria Luiza e disse “é ele!” as palavras saíram mais alto que ela pretendia, ele então olhou em suas direções, e nesse momento Maria Luiza sentiu o coração acelerar e suas pernas paralisarem, foi como se ela tivesse visto um anjo, então este anjo se levantou e se aproximou das duas, agradeceu a Ruth por ter lhe indicado aquele lugar, depois virou-se para Maria Luiza “e voce, quem é?” ela respondeu com a voz tremula “eu me chamo Maria Luiza”, imediatamente a amiga completou “ela é casada com José”, ele então se afastou, e elas foram embora sem dizerem uma única palavra.
   Já passavam da meia noite, embora fosse acostumada a dormir cedo, nesta noite ela não conseguia pegar no sono, além da noite estar muito quente, ela também não conseguia tirar aquele homem dos seus pensamentos, seu corpo queimava de maneira jamais sentido antes, tomou um banho frio e vestiu a roupa sem se enxugar, depois resolveu abrir a janela para tomar um ar fresco e, para sua surpresa, lá estava ele parado como se soubesse que ela abriria a janela. Então lhe sorriu e fez um sinal a chamando, ela retribuiu o sorriso e sinalizou que não, a seguir indicou a porta dos fundos para que ele entrasse, e não foi necessário insistir.
   Maria Luiza tinha o costume de dormir com uma camisa de malha fina e sem nada por baixo, seu corpo molhado deixava os seios seminus, mas nem havia se dado contas. Ele entrou e teve a melhor visão da sua vida, dito depois que conseguiu falar, e também de um ardente beijo, a seguir se entregaram a paixão e o amor se fez ali no chão daquela sala, onde ela se entregou aquele estranho sem medos e sem reservas.
   Os amantes decidiram ficar juntos no sítio da família de Maria Luiza, não morava ninguém por lá, mas ela fazia questão de manter o local limpo. Eles chegaram ao sítio e nem bem entraram, foram logo tirando as roupas e se amando calorosamente, ele olhou profundamente nos olhos dela e disse baixinho “voce é a melhor mulher que eu tive na vida, em todos os sentidos”, e se amaram uma, duas, três e tantas outras vezes durante os dois dias que permaneceram ali. Maria Luiza voltou disposta a por um fim no seu casamento, seus planos era de seguir com aquele que lhe despertou para o amor.
   Os homens voltaram da caçada felizes com o resultado, pois trouxeram uma grande quantidade de carne, o qual foi distribuído entre os amigos. José entrou em casa, deu um alô para mulher e foi tomar um banho, nem ao menos perguntou se ela tinha ficado bem, depois caiu na cama para dormir.
   Ao anoitecer, Maria Luiza que não conseguia parar de pensar no seu amor, pegou umas poucas roupas e partiu para a pensão, mas para sua surpresa, não o encontrou mais lá, onde foi informada que ele havia retirado suas coisas e partido no trem da tarde, deixando um bilhete para ser entregue a ela que dizia o seguinte:

“Querida Maria Luiza, voce é, para sempre, o melhor que me aconteceu, mas eu sou apenas um viajante, não conseguiria me amarrar a alguém, sou como um pássaro que precisa voar sem direção definida e sem parada certa. Saiba que por onde eu andar te levarei comigo, aqui dentro do meu coração”.

   Maria Luiza se deu contas de que nem o nome dele sabia, então mergulhou numa profunda tristeza, permaneceu com o marido, mas jamais permitia que ele a tocasse.
   Dois meses se passaram e veio uma nova surpresa, ela carregava em seu ventre o fruto daquele amor, o seu viajante deixou a presença dele marcada para sempre em sua vida. O marido José, jamais questionou a paternidade de seu filho e, do seu jeito, dedicou o seu amor a sua família.
   Já o viajante, provavelmente está despertando o amor em outros corações pelo mundo a fora.

 

   
Publicado no livro "Nó em pingo d'àgua" - Edição Especial - Abril de 2015