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Aldo Meneguetti
Barueri / SP

 

Uma verdade de cada vez

Joventino entrou pela porta dos fundos bufando mais que trem de apito e foi direto à cozinha:
- Nezinha, quede Percival???
A mulher estranhou o tom áspero do marido; apesar de ser um homem duro e um tanto mal-educado, aquele jeito de falar não era comum nele.
- Calma, homi de Deus!!! Que qui tem Percival?
- Não interessa, chame esse abestado aqui! Agora!
- Percival deve estar mais Edmar no açude módi pescar... Mas o que você tem de tão sério pra falar com o garoto?...
- Goroto é uma pineia!!! Aquilo é um semvergonhudo!... Passei agora mesmo lá pelas bandas do horto e vi uma molecada pulando o muro que dá pro quintal daquele tal de Florêncio... Sabe de quem eu tô falando, não sabe???!!!
Nezinha largou o frango que estava depenando na pia e secando as mãos no pano de prato:
-  O tal de... Florzinha?...
- Esse mesmo!!! – vociferou quase botando os bofes pelas ventas. - Eu tenho certeza que Percival tava junto com aqueles moleques... Conheci pela camisa do Ceará, aquela que eu comprei quando estive na capital, lembra?
- Mas reconheceu só pela camisa?...
- Foi o que deu preu ver, tinha uns cinco ou seis pulando tudo junto...
- Mas o que Percival ia querer no quintal do Florzinha?...
- Mulher, não se mete nisso!!! É coisa de saliência! E das grandes!!!
Só que nesse exato momento a porta do quartinho dos fundos se abre e aparece Percival, com um livro na mão, sem entender nadinha do que estava acontecendo:
- Ô mainha, que qui tá havendo? Por que painho tá tão nervoso?
Mas Juventino logo se antecipou:
- Pois vá lá dentro agora e traga aqui a camisa do Ceará que eu te dei!!!
- A camisa do Ceará, painho?...
- Essa mesmo!!! Vá lá e traga agora! Aqui!!!
- É que não tá comigo, painho... eu emprestei pro Afonso, filho de Dona Leduína...
- E emprestou pra quê???!!!
- É que hoje ele mais Zeca, Tuta, Deoclécio e mais outros iam a uma festa...
- Festa!!!??? E que festa é essa?!
- Ô, painho, é uma festa que o seu Florêncio ia fazer só pros garotos da rua.
- Tá vendo, Nezinha?! Festa só pra garoto... senvergonhice pura!...
Joventino, então, um pouco mais calmo, respirou fundo, tirou o facão da cinta, pendurou no mancebo, e foi até o canto da cozinha acoitar-se num velho toco de jaqueira. Era hora de pedir desculpa.
- Pois é, Percival... Desculpe se pensei mal de você. É que eu vi uns moleques pulando o muro da casa daquela coisinha afrescalhada e achei que um deles era você. Me desculpe, meu filho! Desculpe esse pai velho!
- Ô, painho, não precisa se desculpar, não. Os moleques de vez em quando pulam o muro da casa dele pra fazer saliência... Eu sei. Mas eu nunca fui e nem vou nesses grupinhos...
- Ô, meu filho... me dê um abraço e o seu perdão!...
E Percival, já se sentindo um hominho feito pôs logo os pingos nos is:
- Eu quando vou comer ele, vou é sozinho! E entro pela porta da frente!!!

 

   
Publicado no livro "Nó em pingo d'àgua" - Edição Especial - Abril de 2015