Mamede Gilford de Meneses
Itapipoca / CE
A professora feliz
Na primeira semana de fevereiro de 1953, Meneses, engalanado pela alinhada farda, exigida por Portaria da Secretaria de Educação do Estado do Ceará ,pisou o batente de acesso ao portão de entrada da cobiçada Escola Normal Rural Joaquim Magalhães, de Itapipoca, Ceará, para assistir a aula inaugural como aluno regular da série inicial do curso primário.
Nisso o porteiro com ares de crítica pejorativa o indagou:
- Menino, que cobra te mordeu? Para onde vais com essa mala e o que tem dentro dela?
Meneses, na pele de ofendido, pôs-se a chorar e lhe veio a intuição de respondê-lo malcriadamente:
- O senhor é igualzinho ao Mandioca, um velho abobalhado que atentava as crianças, e só deixou esse hábito no dia que apanhou do pai de um amigo meu! Bicho nenhum me mordeu. A mala que o senhor fala está com livros. A cobra não é minha companheira, é sua; olhe para cima que o senhor a enxergará!
Antônio olhou para a direção sugerida e na copa da árvore que lhe sombreava estava o réptil, aparentemente inofensivo. Então... assustado bradou:
- Valha-me Deus, pra que mexi com ninho de serpente! Vai à classe curumim, a professora está te esperando, mas, antes, peça a formação da fila para cantar o Hino Nacional.
Assim ele procedeu e ao fim da solenidade, na qualidade de aluno novato, foi conduzido pelo inspetor à sala conveniente, e cabisbaixo adentrou-a, assentou-se à carteira que doravante ficaria para si e foi surpreendido com sussurro advindo do colega que lhe estava mais próximo:
- Olhem para o matuto! Só falta ele trazer a enxada!
Nesse instante a professora chegou e os cumprimentou:
- Bom dia meninos!
Todos numa só voz responderam: bom dia, professora!
E ela sorrindo murmurou:
- Meu nome é Norma, mas podem me chamar de Tia! - Em seguida assumiu o cargo, e de acordo com a Lei de Diretrizes do Ensino abriu o livro de presença e sequencialmente chamou-os, e para melhor conhecê-los exigiu que cada um, de pé, anunciasse seu nome de batismo, idade, endereço residencial, e o sinal de futuro.
Na vez de Meneses, ela carinhosamente o indagou:
- Meu filho, o que você quer ser no futuro?
- Tenho vontade de ser um doutor da agricultura para cultivar a terra de meu pai e condicioná-la a produzir meio à sobrevivência do ser humano e do bruto, como diz meu avô. - respondeu.
Esta afirmação emocionou sobremaneira a mestra que suspirando profundamente exclamou:
- Meu Deus, que menino inteligente, nem parece ter vindo do interior! Aí está um exemplo de boa educação doméstica, preciso falar com os seus pais.
Meneses, assoberbado com o elogio, convidou-a para visitá-los no fim de semana mais próximo.
Ela aceitou a proposta e foi à residência da família, cuja receptividade lhe deu satisfação, pois Seu Nonato e Dona Luiza abraçaram-na e a ilustrar o humilde lar adotaram-na como nova filha e autorizaram-na a sentar-se no banquinho e provar uma porção de doce caseiro e perguntaram:
- Que bons ventos a trouxeram à nossa casa?
Combinado ao estilo linguístico ora expresso, respondeu:
- Os ventos que me colocaram em sua casa pertencem à educação de seu glorioso filho que desde o nosso primeiro encontro porta-se configurado de garoto prodígio, isto é, possuidor de farta inteligência e disciplina exemplar, mas o que puxou minha atenção foi o ideal dele; pois ao ser solicitado se afirmou desejoso de formar-se engenheiro agrônomo. O senhor o influenciou a esse respeito?
- Não, senhora, é pensamento nosso deixá-lo a vontade no plano profissional. Naturalmente ele escuta o programa "A voz do Brasil" cujo apresentador relata constantemente sobre o futuro da agropecuária brasileira, fazendo menção ao doutor da lavoura, respondeu Nonato.
- Então é isso - disse Norma. Em sendo assim, de minha parte vai a louvação a Deus a conservar no seio da comunicação, falada ou escrita de nossa "Pátria", esse relevante tipo de informação, a conduzir-nos ao caminho da luz, culturalmente falando e despediu-se com um até breve.
(Homenagem à estimada Norma Braga, minha primeira Professora).
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