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Otaviano Maciel de Alencar Filho
Fortaleza / CE

 

Haja paciência e dinheiro

 
Naquela segunda-feira, João acordou mais cedo que costumeiramente. Sua CNH havia extrapolado o prazo de validade, portanto se fazia necessário a revalidação junto ao órgão responsável pela emissão e fiscalização do trânsito no Estado.
Já com os documentos necessários em mãos, retirou o veículo da garagem e dirigiu-se ao departamento de trânsito, localizado poucos minutos de sua residência.
Chegando ao local procurou algum lugar para estacionar o veículo. Observou que havia algumas vagas de estacionamento que não haviam sido ocupadas. Imediatamente pôs o carro em uma delas. Logo que abriu a porta foi surpreendido por um “flanelinha” que de imediato indicou-lhe uma placa de advertência que indicava ali ser um local de estacionamento com uso de cartão e, portanto, deveria adquirir um de, no mínimo, duas horas. Prontamente foi destacando uma folha e anotando a placa do veículo e revelando o valor a ser pago por duas horas.
- Senhor, vou colocar o horário aqui como se o senhor tivesse chegado uma hora depois, assim  terá mais tempo para resolver seus assuntos.
João ficou temeroso e indagou:
- E se passar um fiscal neste intervalo de hora e observar que a hora foi colocada errada, ele vai me multar, não?
- Pode ficar tranquilo, aqui nunca aconteceu nada disso. - Disse o homem que, olhando disfarçadamente para o outro lado da rua cujo estacionamento era regulamentado sem haver a necessidade de uso de cartão, temia perder a venda do ticket.
- Não vou demorar mais que duas horas, afinal, ainda é cedo e deve haver poucas pessoas para serem atendidas. - Sentenciou João, retirando, da carteira, a quantia a ser paga.
Foi à entrada da instituição onde estava a recepção e foi informado que o setor de CNH estava localizado no último conjunto de salas a sua direita, logo após o pátio onde se realizava a vistoria dos veículos, cerca de cem metros adiante.
Caminhou até o local e lá chegando teve uma grande surpresa: a imensa sala estava abarrotada de pessoas. Filas e mais filas compunham o cenário. Pegou uma senha para pedir mais informação, e somente saiu desta fila cerca de quinze minutos depois, com a informação de que deveria tirar uma cópia da CNH vencida e uma cópia do comprovante de residência e logo depois retornar para ser encaminhado a outro setor.
Lá se vai João providenciar as cópias na fotocopiadora, que se localizava no lado oposto de onde se encontrava. Mais uma fila. Mais quinze minutos. Mais um pagamento efetuado!
Retornando ao setor onde estivera antes, a moça que o atendera minutos atrás informa que ele deverá retirar uma senha e aguardar ser chamado em um dos guichês que se encontravam adiante, a sua esquerda. Mais uma fila! Sua senha era a de número 87 e por enquanto a senha chamada era a de número 23.
Os minutos vão escoando e quarenta e cinco minutos depois João ouve o número de sua senha ser chamada. Vai até o guichê e outro atendente solicita as cópias dos documentos, pois irá emitir um boleto para que seja efetuado o pagamento que possibilitará a confecção da nova CNH. Neste momento é informado que existem postos bancários ali mesmo nos prédios que compõem o órgão departamental, e tão somente depois deverá retornar para dar entrada no serviço de solicitação de avaliação médica.
Novamente, lá vai João de encontro a mais uma fila, e que fila! Mais um pagamento!
Aproximadamente cinquenta pessoas se encontravam na fila em uma sala pequena, cujo condicionador de ar não estava funcionando e somente uma atendente de caixa para dar conta desse contingente de pessoas que, com o calor que fazia no local, estavam agitadas e aborrecidas com a demora em serem atendidas. Algumas pessoas saíram da fila em busca de outro posto bancário. João estava indeciso: se saísse e fosse para outro local enfrentaria, talvez uma fila maior. Contudo decidiu, depois de aproximadamente meia hora na fila ir procurar outro local para efetuar o pagamento, deixando o sururu por lá mesmo!
De novo, lá vai João em sua peregrinação. Em uma agência bancária localizada dentro do pátio da instituição, vai para mais uma fila e só não fica nela porque é informado que a agencia só abrirá meia hora depois e é aconselhado por um homem que se encontrava na fila pra ir até outro posto localizado nas proximidades e que funcionava desde cedo.
Suado, cansado e aborrecido João pensava em desistir e voltar outro dia ou talvez deixar para renovar sua CNH em outra unidade do órgão, em dia oportuno. Mas ao mesmo tempo tinha a certeza que seria outro dia de chateação, então decidiu continuar sua via-crúcis.
Coitado de João, nesse vai e vem, nem lembrava mais do carro estacionado lá fora do pátio. Chegando ao local indicado, que alívio, apenas cinco pessoas na fila e o ambiente estava climatizado. Não demoraria mais que dez minutos para ser atendido, calculou. O dia não estava bom para João, logo foram chegando alguns idosos para serem atendidos e como a lei garante ao idoso prioridade eles iam sendo atendidos preferencialmente, elevando o cálculo de João para cerca de trinta minutos. Logo após este tempo, finalmente ele foi atendido. Deixou para trás mais uma fila e mais dinheiro. Retornou ao local inicial para dar entrada nos exames médicos.
- Pronto, até que enfim, serei atendido. - Desabafou João, consigo mesmo!
- O senhor espere nesta fila que o médico o atenderá. – Afirmou uma tendente.
- Impossível, chega de tanta fila! - Disse João quando viu o tamanho dela. Demorou uma hora para ser atendido pela profissional de medicina oftalmológica, que sem delongas fez o exame em apenas cinco minutos, deixando João livre para ir embora.
Quando João se deu conta do tempo que se passou ficou apavorado, pois teria de pagar, desta vez, uma multa por exceder o tempo permitido para estacionamento. Apressadamente voltou até o veículo e lá chegando encontrou o “flanelinha” ao lado do carro.
- E o senhor disse que não demoraria mais que duas horas, hein? Mas trato é trato. Até logo!

        

   
Conto publicado no livro "Seleta de Contos de Grandes Autores Brasileiros"- Edição Especial - Julho de 2015