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Francisco Ferreira
Carta de despedida Se me permitis, me apresento: Se a apatia me move, Transfiguro-me, transfujo, transgênico-me.
Seria fantástico que hoje, quando tudo parece estar na contramão em minha vida, eu tivesse alguém... Qualquer pessoa, um ser humano qualquer... Mas que não fosse preciso explicar ou explicitar as minhas dores, que eu não tivesse, por obrigação, de abrir baús, velhas gavetas e desacorrentar antigos fantasmas, há muito, apodrecendo emparedados na sala de estar de minha mente confusa, que não tivesse de despir-me e expor publicamente a nudez horrenda de minha alma...
Que eu tivesse alguém que pudesse ou quisesse me compreender, a partir de meus atos tidos como desvairados, sem me analisar “os grilos” á luz de suas próprias conveniências ou das ridículas e hipócritas convenções sociais. Esse verme-fálico ereto inerte. Se eu tivesse alguém - qualquer pessoa - que procurasse encontrar quaisquer boas virtudes, tão poucas em mim e não ficasse evidenciando mais ainda os meus vícios (tantos) ou não inventasse novos, para deixar-me ainda mais deprimido... Esta quixotesca figura Se eu tivesse alguém - qualquer pessoa – que não me quisesse como um simples robô, autômato, um deus infalível; mas que me tomasse unicamente como humano. Principalmente, um ser humano que está atravessando um momento difícil e absurdamente adverso... Não há ancoradouro neste cais Se eu tivesse alguém nesse momento - qualquer pessoa – que antes de ganhar o meu, quisesse me dar “colo”; que antes de em mim, quisesse me apoiar; que antes de receber, me desse sustentação... Neste mundo de horror Já que não bastasse Abstrata, Se eu tivesse alguém –qualquer pessoa – que no deserto que está se tornando a minha vida, fosse uma única flor, ainda que pequenina, e não apenas só mais um dos milhares de espinhos... Seria fantástico que eu tivesse alguém, qualquer pessoa... Vós! A vossa ausência é cega, Não penso no futuro, tão obscuro, Vou morrer hoje, por sua causa, vossa... vossa... vossa... Em vossa ausência árida
Foi para casa, se embebedou e acordou, na manhã seguinte, numa tremenda ressaca e com o frasco de remédios para insônia aberto e com os comprimidos espalhados pelo tapete da sala. Juntou os cacos de sua dignidade e amor próprio e foi trabalhar.
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Conto
publicado no livro "Seleta de Contos de Grandes Autores Brasileiros"- Edição
Especial - Julho de 2015
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