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José Antonio Silva Santos
Rio de Janeiro / RJ

 

O mistério do sétimo filho

O povoado conhecido como Cosme e Damião, localizado no interior do Rio de Janeiro, foi marcado por uma festança em comemoração ao casamento de Raimundo Chaves e Marizete Oliveira, filhos de importantes fazendeiros da região. Praticamente todos daquele lugar compareceram a festa, inclusive a jovem Maria Rita Araújo, que apesar de ter só quatorze anos de idade, teve um rápido romance com Raimundo, onde ele se aproveitou da sua inocência.
Maria Rita morava as margens do Rio Sarandy, num casebre caindo aos pedaços, era filha de uma mulher conhecida como Viúva Negra, devido aos diversos companheiros mortos enquanto estavam em sua companhia. Durante os festejos, a jovem entrou no quarto do casal, deitou-se na cama e disse em voz alta “tudo isso aqui deveria ser meu”, no exato momento que Marizete também entrou no quarto, causando uma enorme confusão. Maria Rita foi expulsa da festa e quase apanhou dos familiares dos noivos, então ela olhou fixamente para Raimundo e disse “vocês vão me pagar por esta humilhação”.
Dois anos depois, nasceu o primeiro filho do casal, o qual recebeu o nome de Carlos Oliveira Chaves, e durante sete anos consecutivos Marizete deu a luz a um menino, o sétimo filho recebeu o nome de Kalil, que significa amigo, e foi escolhido a partir de um sonho durante a gestação.
O tempo passou, a família se preparava para uma festa surpresa pelo aniversário de quatorze anos do Kalil, ele estudava distante e só retornava no inicio da noite. O rapaz caminhava até o ponto do bonde quando de repente ouviu seu nome ser chamado, não reconheceu a mulher que lhe acenava do outro lado da rua, ele se sentiu paralisado por tamanha beleza, ela atravessou a rua e lhe deu os parabéns com um abraço forte e um beijo no canto da boca, então quis saber quem era aquela mulher que estava deixando suas pernas bambas. Ela o levou a uma conhecida confeitaria no Centro do Rio de Janeiro, onde o foi seduzindo com cada gesto e cada palavra. Quando se despediram, o rapaz estava ofegante e com o coração disparado.
Ao chegar em casa, o rapaz encontrou a família acompanhada por alguns vizinhos numa euforia tremenda, a princípio ele até ficou contagiado por aquela alegria, mas logo mergulhou nas lembranças daquela tarde maravilhosa, a noite foi curta para tantos pensamentos, estava tendo inicio a sua primeira paixão.
Três dias haviam se passado e nada de Maria Rita aparecer, estava ele cabisbaixo esperando a condução quando ouviu seu nome ser chamado, logo o sorriso lhe veio ao rosto, e desta vez foi ele quem atravessou a rua para encontrá-la, depois de um longo abraço, ela olhou para um lado e para o outro, como não tinha ninguém por perto, deu um beijinho na boca do rapaz, ele quis mais, mas ela disse que não era prudente ali, e o chamou para ir a sua casa.
Maria Rita com seus trinta e sete anos de idade e em excelente forma física, tinha o total controle da situação, mesmo assim ela se comportava como uma adolescente, tal qual o rapaz, isso o deixava a vontade para a sua primeira vez, então ela o fez sentir-se um homem de verdade, e se faltou alguma coisa para ela, ele não se deu conta. Eles passaram a se encontrar pelo menos três vezes na semana, isso estava tirando sua concentração nos estudos, na verdade ele quase nem comparecia as aulas. Maria Rita não trabalhava e tinha todo o tempo para se dedicar aos seus objetivos. Ela era mantida economicamente por um político casado e com a idade mais avançada, que a visitava pouquíssimas vezes, mas lhe proporcionava uma vida bem confortável.
Os pais de Kalil estavam percebendo que havia algo errado com o filho, só se relacionava bem com o irmão mais velho, que lhe dava dicas de como tratar uma mulher na intimidade, tudo em absoluto segredo.
A cidade passava por uma onda de violência, e no povoado não era diferente, onde o irmão acima de Kalil foi assassinado a trezentos metros de casa, numa tentativa de assalto. Passados cinco meses, mais um de seus irmãos foi assassinado, desta vez a facadas depois de uma simples discussão. Estranhamente, um ano depois mais dois irmãos que andavam de bicicleta foram atropelados por um caminhão e não resistiram aos ferimentos. O irmão abaixo de Carlos entrou num quadro de depressão e foi encontrado morto por ter ingerido veneno de rato. Raimundo e Marizete haviam perdido cinco filhos num período de dois anos, só lhes restava o mais velho e o mais novo.
Quando Kalil completou dezoito anos, Maria Rita pediu que ele a apresentasse aos seus pais, prontamente ele atendeu o seu pedido. Apesar da diferença de idade, ela foi bem recebida pela mãe do rapaz, que não a reconheceu. Carlos ficou tão impressionado que não conseguia tirar os olhos das belas curvas da cunhada, o que logo foi percebido por ela, e depois de se insinuar muito para o rapaz, deu um jeito de lhe passar um bilhetinho com o seu endereço. No dia seguinte Carlos foi visitá-la, não trocaram uma única palavra, se olharam e se agarraram ali na sala mesmo.
A grande tragédia estava por vir, Maria Rita foi à casa de Kalil, aonde chegou aos prantos, alegando ter sido estuprada por Carlos. Um ódio incontrolável tomou conta do rapaz, que invadiu o quarto do irmão e o agrediu com vários socos, o pai tentava interferir se colocando entre eles, mas o pior estava por vir, Carlos gritou que havia feito tudo com o consentimento dela, então Kalil pegou uma faca e aplicou vários golpes no irmão, que sangrou até a morte.
Maria Rita tirou o rapaz do local e desapareceram sem deixar pistas. Seis meses depois ela procurou Marizete e a fez lembrar-se do dia do seu casamento, onde eles a humilharam, mas que agora eles estavam quites, pois ela havia eliminado um por um de seus filhos, quanto a Kalil, este seria o substituto de Raimundo que deveria ter sido seu, mas agora ela já não queria mais aquele homem que se tornou um velho fraco, por enquanto iria se divertir com o seu brinquedinho “cheirando a leite”. O paradeiro do sétimo filho se tornou um mistério que nunca foi desvendado.


   
Publicado no livro "Xeque-mate" - Contos selecionados - Edição Especial - Novembro de 2014